A estratégia de segmentação de mercados é muito antiga. Os primeiros relatos da aplicação desta estratégia em mercados referem-se ao nascimento do serviço de transporte ferroviário de passageiros na Inglaterra do século XIX.
A tecnologia de locomotivas a vapor e a sua produção em maior escala permitiu aos transportadores a possibilidade de expandir seus mercados para o transporte de passageiros. Potentes locomotivas estavam à disposição no mercado e com a capacidade de transportar muitos passageiros.
No entanto, para viabilizar a expansão do transporte de passageiros e colocar as novas locomotivas em operação seria necessária a expansão da demanda por transporte. Uma forma consagrada para aumentar as vendas seria a redução do preço do produto vendido.
Esta simples estratégia de redução de preços para aumento das vendas incomodou um investidor no setor ferroviário. Sabendo que seus clientes estavam consumindo e pagando preços altos desejava vender mais, mas sem ter que reduzir o preço para os que já pagavam altos valores.
A estratégia utilizada foi asegmentação do mercado.O investidor que oferecia o transporte ferroviário de passageiros em vagões fechados, com janela de vidro, fez sua próxima encomenda de vagões optando por modelos abertos nas laterais, onde os passageiros viajariam sentindo as intempéries doclima, como vento e eventualmente chuva. Encomendou também alguns vagões sem parede e sem teto, onde os passageiros também sofreriam o desconforto do sol.
A sua estratégia consistia em justificar para os que pagavam caro o preço mais elevado associado a um conforto maior. Assim pode reduzir o preço para os que desejassem entrar no hall de consumidores do transporte ferroviário de passageiros, mas que não estavam dispostos a pagar tão alto valor pelas passagens. Bastava para isso aceitar viajar com um pouco menos de conforto.
Com esta estratégia o empresário manteve seus clientes antigos pagando altos preços e expandiu o seu mercado para novos clientes que poderiam agora pagar mais barato por um serviço similar, com um conforto um pouco menor.
Um detalhe importante desta estratégia de mercado é que muitas vezes ela é fundamentada unicamente na demanda e não nos custos de produção. Relatos indicam que o investidor do setor ferroviário pagou o mesmo preço pela aquisição dos vagões sem paredes laterais do que pagaria por vagões fechados. As toras de sustentação do teto deveriam ser mais espessas para resistir ao arrasto do vendo e saia tão caro quanto finas lâminas de madeira que poderiam ser utilizadas como paredes. O fato de não ter as paredes era apenas uma estratégia de mercado e não necessariamente de custos.
Esta estratégia é adotada até hoje por diversos setores da economia. Desde as diferentes classes de transporte (1ª classe, executiva e econômica) até chocolates, iogurtes, eletrônicos e serviços bancários. No nosso programa falaremos de alguns exemplos da nossa região. Não deixe de assistir o vídeo.
Neste texto apresentaremos apenas um caso interessante de segmentação de mercado sem nenhum tipo de mudança de qualidade no produto que é conhecido como meia entrada, comum em cinemas, por exemplo. Ao saber que os estudantes possuem restrições orçamentárias mais rígidas que os consumidores que já estão no mercado de trabalho os cinemas com o intuito de ocupar mais lugares em suas salas, principalmente em dias de menor movimento, estimulam o consumo por parte deste público reduzindo o valor apenas para estes.
Estudantes geralmente possuem poucos recursos para gastar com cinemas e possuem outras alternativas de lazer, como festas, bares e outros eventos. Para estimular o consumo deste mercado os preços são reduzidos, mas apenas para quem apresentar a carteirinha comprovando fazer parte do segmento dos estudantes. Isto que parece ser um direito conquistado pelos estudantes é na verdade mantido e desejado pelos empresários do setor. Uma forma de cobrar caro de quem pode pagar caro e não permitir que os que possuem mais recursos paguem mais barato.
Alternativas são dadas para os consumidores que não são estudantes e não estão dispostos a pagar caro para assistir a um filme no cinema, por exemplo. Geralmente em um dia ou horário da semana de menor fluxo, qualquer cliente pode pagar a meia entrada. Parcerias com outras empresas, por exemplo, clientes de determinada operadora de celular ou de um banco que providenciarem uma carteirinha de associado a um clube de vantagens (muitas vezes sem custo financeiro adicional) podem pagar valores menores. Todas estas chances de pagar mais barato são dadas, principalmente em mercados onde a estrutura de oferta é fixa e está com capacidade ociosa. São alternativas que permitem aos consumidores menos dispostos a gastarem com a atividade também consumirem sem implicar ao ofertante uma redução no lucro das vendas para os que estão dispostos a pagar valores maiores.
Conhecendo estas estratégias cabe ao consumidor buscar estas oportunidades e sempre atuarem como os que estão dispostos a pagarem a opção mais barata, muitas das vezes, sem redução substantiva na qualidade do produto.
No nosso painel de hoje convidamos você a tentar identificar as estratégias de segmentação de mercado nos setores da economia que você consome. Existem opções ofertadas pela mesma empresa que são mais baratas? A qualidade do produto muda de forma significante a ponto de justificar o preço tão mais elevado? Você não poderia estar consumindo em um segmento onde o preço é menor sem perda de satisfação ou qualidade?
No próximo paineltrataremos dos”nudges“, ou conhecidos empurrõezinhos para estimular o consumo. Tema muito interessantes e que expõem os consumidores à estratégias que em determinadas situações podem ser danosas às finanças pessoais.
Até o nosso próximo artigo!
Prof. Dr. Moisés Diniz Vassallo
Prof. Dr. André Luiz Medeiros
DENARIUS – Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Financeira
Instituto de Engenharia de Produção e Gestão (IEPG)
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI).