Colocar-se na própria agenda.
O que é isso?
Em meio a incontáveis compromissos, constantes preocupações, problemas cotidianos, demandas profissionais, familiares e sociais de toda ordem, certamente você já tentou colocar-se na própria agenda.
Conseguiu? E conseguiu permanecer nela?
Não é uma tarefa fácil.
Colocar-se na própria agenda é uma façanha magistral.
Vamos por partes.
Quantas vezes, na adolescência, encantei adultos com essa indagação! Não obtive respostas satisfatórias.
“O ‘eu’ é um labirinto escuro e sem saída, meu jovem. Para que entrar nele? Cuide da sua vida e seja feliz…” Escutei, certa vez, de um familiar muito culto.
Não desisti, porém, de encontrar a porta do labirinto.
Embrenhei-me na juventude, andei com gosto por várias correntes de pensamento e ao final, decepcionado, resolvi dar uma pausa nas minhas andanças atrás do “eu” e arquivei a minha busca.
Ainda bem que isso se deu temporariamente, pois, de toda essa busca pelo incógnito, sobreviveu dentro de mim algo muito valioso: a inquietude do saber, de conhecer os mistérios da figura humana e os segredos da vida e do destino.
Nos primórdios da etapa juvenil vieram a faculdade, o trabalho remunerado e, na esteira, os excessos da diversão e do lazer. Meu lema era estudar, trabalhar, monetizar as oportunidades profissionais e divertir-me o máximo possível. Pisei fundo no acelerador e finalizei essa fase verdejante da vida, na qual andei agitadamente em círculos.
Já adulto, como executivo de uma instituição bancária, autorizei a demissão por justa causa de um jovenzinho que trabalhava no meu setor, por furto. Ao indagá-lo para conhecer os motivos do seu delito, escutei dele, aos prantos: — Eu não sou assim! Nunca furtei! É a primeira vez! O que dentro de mim me levou a fazer isso? — Dentro de você? Não sei, lhe respondi.
Esse episódio muito me preocupou, levando-me a comprovar algo de que já tinha percebido: o homem é um ilustre desconhecido de si mesmo. Nasce, cresce, vive e morre de costas para si, às escuras, com as luzes internas apagadas.
Naquele dia, ao retornar para casa, percebi que a pergunta do jovem demitido – “O que dentro de mim me levou a fazer isso?” — ressuscitou a minha antiga inquietude: quem sou eu?
Reiniciei minha maratona em busca de respostas. Em vão.
Foi nessa altura da vida que contatei a Logosofia. Era fevereiro de 1981. Véspera de carnaval. Contava com 36 anos de idade. Ganhei o livro “Mecanismo da Vida Consciente”. Não participei dos festejos de Momo, mas minha mente pulou ininterruptamente, ao tomar contato com o conteúdo daquele livro. Nele estava uma porção de tudo o que vinha procurando, a começar pela “Busca infrutífera do Saber”; passando por “O pensamento como entidade autônoma”; “O espírito” e, finalizando, “O homem pode ser seu próprio redentor”.
Bastou-me a revelação da existência no ser humano de três sistemas: o sistema mental; o sistema sensível; e o sistema instintivo. Inquietou-me o conceito de pensamentos como “entidades psicológicas autônomas”. O que seriam?
Apesar de considerar-me naquele tempo com um razoável grau de cultura, a afirmativa de que “A Logosofia não pretende ensinar nada do que o homem já sabe, senão o que ignora” não me causou nenhuma reação então.
Recordo-me das primeiras impressões de felicidade ao estudar sobre a gênese e a vida dos pensamentos e o mecanismo da inteligência com suas faculdades: pensar, observar, entender, imaginar, refletir, recordar etc.
Que conhecimentos estupendos, exclamei!
Aí está algo do conhecimento de si mesmo, enunciado por Sócrates há mais de dois milênios, voltei a exclamar!
Com este conhecimento poderei interferir, conscientemente, nos movimentos da minha mente, nos meus pensamentos, na vontade e até nos sentimentos! E mais: com conhecimentos assim, poderei promover dentro de mim uma extraordinária organização interna! Agora sim, parece-me que encontrei o verdadeiro caminho para conhecer quem sou eu.
Assim, o “eu” foi perdendo o formato de “um labirinto escuro” impossível de ser encontrado e percorrido, para se tornar uma realidade palpável, cultivável, aperfeiçoável e realizável.
O estudo da Ciência Logosófica, com seu inigualável método científico, vem oferecendo-me resultados e benefícios, antes desconhecidos totalmente por mim.
Gradativamente, à medida que aprendi a administrar o tempo com objetividade e serenidade, ele passou a sobrar. Venho aprendendo a retirar o meu “eu” do círculo vicioso das preocupações comuns.
Estudo Logosofia porque, no final de cada dia, ao folhear minha agenda, encontro o meu nome nela em um lugar de destaque. Colocar-se na própria agenda é uma arte magistral! É preciso se conhecer. Saber como estamos e como deveríamos estar funcionando por dentro!
Quero relatar-lhes outra vivência valiosa. Certa vez, por força da profissão, participei de um simpósio sobre as maneiras de melhorar a convivência no trabalho. Nas palestras e reuniões escutei de tudo, menos o principal: os verdadeiros causadores dos conflitos nas relações profissionais são os pensamentos negativos enquistados nas mentes humanas que se convertem em deficiências psicológicas, tais como: impulsividade, impaciência, intolerância, irritabilidade, falta de vontade, timidez, egoísmo, vaidade, etc. Hoje, estudando os movimentos dessas deficiências na minha psicologia com o objetivo de me aperfeiçoar, tenho a convicção de que, se a humanidade adquirisse este conhecimento e o praticasse, ainda que em parte, o mundo converter-se-ia no melhor local para todos viverem em paz.
Há tempos, um aluno perguntou por que eu estudava Logosofia. Fiquei preocupado em lhe dar uma resposta assimilável, devido à sua idade. Ao pensar rapidamente no que lhe dizer, observei uma agenda sobre a mesa. “Bom”, manifestei-lhe, “você daqui a pouco ingressará na faculdade e logo estará no mercado de trabalho. Como é ótimo aluno, seguramente terá uma enorme clientela, trabalhará bastante, será bem remunerado e certamente não terá tempo para si. Ano após ano, seus compromissos diários e os nomes de seus clientes serão anotados em agendas, iguais a esta.
Com afeto lhe perguntei: “você entendeu?
Ele acenou positivamente com as mãos, e me disse: “Eu também quero aprender essa arte, enquanto a minha agenda ainda está vazia.”
Um pensamento de Daniel Martins