O documentário inicia com Cohen entrevistando uma senhora de 90 anos. Ela não estava demente, aparentava até um ar tranquilo, porém aquele indesejável e estranho silêncio já se instalara em sua vida como na vida de muitos que ficam idosos e perdem a alegria vivificante tão presente na juventude. Ela respondeu à primeira pergunta sobre idade, mas quando questionada sobre sua vida de jovem, disse não se lembrar de nada. Então Cohen perguntou se ela estaria disposta a fazer uma experiência, e em seguida colocou nela os fones de ouvido e ligou um iPod com músicas anteriormente escolhidas baseadas em fatos que ele pôde recolher sobre a vida da velha senhora. Ao ouvir a música, imediatamente ela abriu um franco sorriso e disse: “é de Louis Armstrong”, e foi acrescentando o nome da música, mais e mais lembranças de seu tempo de jovem, da escola, de seu trabalho, do tempo da guerra, dia e ano do nascimento de seu filho e outras lembranças. Foi como se a música fosse abrindo uma porta, depois outra e muitas outras mais. E ao final ela exclamou surpresa: “eu não sabia que ainda podia falar tanto e me lembrar tanto de tanta coisa”.
A experiência se repetiu com vários outros idosos. Henry era um paciente idoso e demente. Não interagia com ninguém, com nada. Nada fazia com que ele saísse de seu mutismo, nem mesmo abrisse os olhos. A enfermeira colocou os fones e à medida que ouvia a música, Henry foi modificando seu comportamento. Aos poucos foi abrindo e arregalando os olhos, foi se mexendo na cadeira de rodas como se estivesse dançando, e perguntou à enfermeira: “eu devo cantar também?” ao que ela respondeu: “se você quiser”. E ele cantou, brandindo os braços como se regesse a música! Sua filha contou que ele estava neste lar há dez anos, sempre quieto e de olhos fechados. E isto era muito triste porque ele havia sido um homem alegre, que adorava música, adorava cantar e dançar. Dan Cohen perguntou a ele: “Henry, você gosta de música?”, e ele: “Eu sou louco por música!”. “Henry, qual a sua música preferida?” Henry não respondeu, mas com um novo brilho nos olhos, começou a cantar a música de que mais gostava com voz forte, sem titubear na letra. Foi fantástico! Foi como se alguém acordasse o Henry que dormia profundamente há tantos anos. A música o trouxe de volta à vida.
A música está sempre ligada à vida de alguém. Normalmente sentimos emoções alegres ou tristes quando ouvimos canções de que gostamos, e ao longo de nossa vida essas canções vão se imprimindo em nosso inconsciente e sempre relacionadas a acontecimentos, relacionamentos e fatos. A música nos faz vivos! Sempre que eu ouço a “Valsa do Imperador”, ou mesmo “Billie Jean” do Michael Jackson, eu fecho os olhos e me sinto capaz de sonhar indefinidamente.
O filho do escritor russo Tostoi deu um depoimento intrigante sobre o pai. Disse ele: “Eu não encontrei em minha vida ninguém que sentisse a música tão intensamente como meu pai. Ouvindo música de seu agrado, perturbava-se, tinha um aperto na garganta, soltava soluços e vertia lágrimas”. Certa vez o escritor exclamou: “Que me veut cette musique?” (O que quer de mim esta música?) E Tolstoi ainda diz: “A música é a taquigrafia dos sentimentos!” Perfeito, não?
Voltando ao documentário sobre Dan Cohen, um neurologista atestou que a música tem o poder de ativar mais partes do cérebro do que qualquer outro estímulo. É a última ligação da pessoa com sua própria identidade. Para as pessoas com demência pode ser a porta dos fundos da mente que se abre, deixando voltar a vida que um dia já pulsou dentro daquela pessoa. A música pode ser o resgate da conexão com a vida. Cohen pergunta: “e se todas as pessoas dementes pudessem acordar como o Henry? E se todas as pessoas pudessem acordar para o que elas são?” Bem, obviamente, quando a doença está em estado avançado, talvez não se possa recuperar a conexão, mas vale a pena tentar!
Contudo, a implementação de tal experiência nos lares para idosos não é tão simples assim, pois esbarra numa grande dificuldade: o governo não concorda com a aquisição de cinco milhões de iPods para os dementes americanos, alegando que já gasta demasiadamente com os medicamentos que pouco fazem pelos idosos dementes, mas certamente enriquecem mais ainda os bilionários laboratórios de medicamentos.
E vamos que vamos! Música, maestro!