Num pequeno lugar, um grupo de pessoas sempre se divertia com o ‘idiota da aldeia’. Era um pobre coitado, sem nenhuma intelectualidade, que vivia de pequenos biscates e esmolas. Diariamente o chamavam ao bar e ofereciam a ele uma escolha entre duas opções: uma moeda de um real ou outra de cinquenta centavos. Ele pegava a menor e deixava a de um real sobre o balcão, o que era motivo de risos para todos.
Certo dia, um dos poucos amigos que tinha, chamou-lhe e perguntou se ainda não havia percebido que a moeda que escolhia valia menos. O bobo, respondeu: ‘É claro que sei, mas se eu pegar a maior, a brincadeira acaba e vou deixar de ganhar cinquenta centavos!’
Pois bem, quais eram os verdadeiros tolos na história? Certamente não era o ‘bobo’, pois ele se mostrava pouco ganancioso – a ponto de manter sua miúda fonte de renda – e não se importava com a opinião dos outros a seu respeito. Como a ambição e o orgulho derrubam muita gente importante, o ‘bobinho’ conseguia levar a vida com alguma sabedoria.
Mas, logicamente, ninguém gostaria de estar no lugar dele, concorda? Sabemos que é triste depender de esmolas para viver, embora ser rico também é motivo de desgraça para muitos. Eu que nunca estive em nenhuma dessas duas situações – graças a Deus! –, e fico imaginando o que faria se precisasse enfrentar um dos extremos financeiros: a miséria ou a fortuna.
Sem sapatos para calçar, será que eu iria à missa? E com um iate para descansar nos finais de semana, será que eu daria valor à missa? Com fome, será que eu rezaria o terço? E com alguns cavalos bonitos para montar, será que eu teria tempo para rezar um pouco ao levantar e ao deitar?
Já conclui que, tanto o rico quanto o pobre, precisam de muita ajuda para chegar ao Céu. Ao pobre, a ajuda material é tão importante quanto a espiritual; ao rico egoísta, apenas a orientação espiritual seria necessária, porque, se bem aceita, implicaria na ajuda material ao pobre também.
Então, parece simples resolver todo o problema. Primeiro, convencemos o rico a se converter e a ajudar o pobre; depois, prestamos socorro material ao necessitado e o evangelizamos também. Isso é utopia?
Se você tivesse que ajudar ou receber ajuda, quem gostaria de ser: o rico, o pobre ou o vicentino? Se responder ‘nenhum deles’, eu diria que não é justo você deixar de contribuir para melhorar a situação social em que vivemos. Veja bem: se precisa de algum tipo de ajuda, assuma a sua condição de pobreza – material ou espiritual – e procure alguém que possa lhe orientar; se tem suficientes bens materiais e boa bagagem espiritual, doe um pouco a quem não as têm; e se pode dispor de algum tempo para socorrer um irmão, torne-se vicentino e se santifique conosco!
Então, eu diria que não é utópico imaginar o número de vicentinos aumentando a cada dia no mundo inteiro e, em consequência, a nossa rede de caridade atingindo todas as pessoas que sofrem. Essa foi a ideia de Antonio Frederico Ozanam quando fundou a Sociedade de São Vicente de Paulo, há 187 anos na França, e já estamos presentes em mais de 140 países! Isso se tornou realidade porque o amor a Deus e ao próximo fazem parte de nossas vidas; portanto, só não será possível pensar num mundo melhor quando não existirem corações misericordiosos na face da Terra – e Jesus não deixará isso acontecer.
O problema é que, cada vez mais, a desigualdade social aumenta. Se imaginarmos uma pirâmide, na base estão os mais sofridos e na região do vértice superior se encontram os milionários. A cada ano que passa, a base aumenta e a altura da pirâmide também, o que significa dizer que a miséria vem crescendo em função: do desemprego, da insensibilidade à partilha, do pequeno rebanho que se dispõe a dar testemunho do Evangelho, enfim, o espírito cristão atinge muito pouca gente!
Madre Teresa dizia: “O que eu posso fazer, você não pode; o que você pode, eu não posso; mas, juntos, podemos fazer belas coisas para Deus”. Isso não é a pura verdade se pegarmos pessoas que estão no topo e na base da pirâmide? E você concorda que quem está em cima vê o de baixo como se fosse aquele ‘bobinho’ da história? Porém, Deus não pensa assim e, provavelmente, dá muito mais valor ao sofrimento daquele que possui poucas moedas.
Às vezes, fico pensando como é possível algumas pessoas não serem tocadas pelo Amor de Deus! Quase todos os problemas se resolveriam se acabassem: o orgulho, a vaidade, o egoísmo e a ambição nos corações humanos! Por que, para alguns, é tão difícil aceitar um chamado do Céu e reconhecer que a nossa missão espiritual é maior do que qualquer outra nesse mundo? Há mais de dois mil anos, muita gente de fé vem testemunhando as maravilhas pregadas por Jesus Cristo: os apóstolos contaram a São Paulo, que contou a São Lucas, que contou a São Jerônimo… que contou ao padre, que contou a mim, que estou contando a você… que contará ao seu neto… que continuará lutando contra a injustiça social…
Assim seja!
Paulo R. Labegalini
Cursilhista e Ovisista. Vicentino em Itajubá. Engenheiro civil e professor doutor do Instituto Federal Sul de Minas (Pouso Alegre – MG).