Por André Luiz Medeiros, Moisés Diniz Vassallo, Victor Eduardo de Mello Valerio
Recentemente tem-se noticiado de forma recorrente a quebra de recordes de pontos do Ibovespa, atualmente em 109.581[1]. Neste painel de educação financeira explicaremos de forma simplificada o que significa este número, por que ele está sempre nos jornais e porque, ao menos no curto prazo, este número será ainda mais comentado pelos brasileiros.
O Ibovespa é um índice que representa os ganhos em termos de valor monetário de um conjunto de ações. Esta cesta é composta pelas ações de maior negociação na maior bolsa de valores do Brasil a B3 (antiga Bovespa). A cada quatro anos as ações que compõem a cesta são atualizadas. Estas ações de empresas que compõem o Ibovespa representam em média 80% de todo volume de negociações da bolsa no Brasil.
Ou seja, o Ibovespa é um índice que indica a valorização ou desvalorização ao longo do tempo das ações que o compõem. O índice começou com o valor de 100 pontos em 1968 e hoje já atinge 109.581 pontos.
Muitas vezes o noticiário indica o crescimento percentual dos pontos. Por exemplo, se em um dia o Ibovespa estava em 100.000 pontos e no dia seguinte fecha em 101.000 pontos, diz-se que a bolsa subiu 1%. O que equivale afirmar que em média as ações que compõem o índice tiveram seus preços elevados em 1%[2].
Somente no último mês o Ibovespa subiu 9,6%, o que significa dizer que o valor das ações que compõem o índice cresceu em média este percentual. Ou seja, se alguém tivesse um lote padrão de ações de cada empresa que compõe o Ibovespa, teria ganho 9,6% em termos de valorização de seu capital. Este ganho é expressivo, principalmente se compararmos com os ganhos dos investimentos de baixíssimo risco mais comumente feitos pela população brasileira como da caderneta de poupança, CDB (100% do CDI) ou título do governo atrelado a Selic, que renderam 0,32%, 0,48% e 0,48%, respectivamente no mês de outubro de 2019.
No ano de 2019 o Ibovespa já subiu 20,4%, e muito desta valorização está associada com um outro fenômeno que já discutimos aqui no nosso painel de educação financeira. A redução da taxa Selic[3] para o mínimo histórico, tendo começado o ano de 2019 com o rendimento de 6,5% ao ano e recentemente reduzida para 5,0% ao ano com perspectiva de uma nova redução para 4,5% ainda este ano.
Com uma rentabilidade tão reduzida (4,5% ao ano) cada vez mais os investidores e poupadores estão procurando alternativas de maior rentabilidade. Neste cenário é natural que muitos migrem seus investimentos para o mercado de ações, mais arriscado mas com retornos mais expressivos nos últimos meses. Este mercado consiste na compra de participações em empresas listadas em bolsa, ou seja, empresas de capital aberto que qualquer interessado com recursos suficientes pode adquirir.
Como em qualquer mercado de bens privados, um aumento da demanda por um bem, serviço, produto ou ativo quando não acompanhado de um aumento na oferta, implica em elevação de preços. Isto vale, por exemplo, para o mercado de tomate, ovos, gasolina e também para o mercado de ações na bolsa de valores. Em qualquer um destes mercados, um aumento na procura (demanda) tem potencial de gerar aumento de preços quando a oferta não varia.
Com muitos investidores migrando das opções que hoje estão com baixa rentabilidade (poupança, CDB e títulos do governo) para a o mercado de ações, é natural que os preços das ações subam, devido ao aumento da demanda. No entanto, neste painel queremos alertar aos que estão migrando para este mercado de ações, e principalmente, para aqueles com menos experiência, que o preço de uma ação representa a expectativa de retornos futuros com os lucros da empresa descontado por uma taxa de rentabilidade esperada.
Ou seja, admitindo que o mercado é perfeito um aumento no preço das ações pode significar duas coisas, ou uma expectativa de aumento dos lucros que a empresa irá auferir no futuro ou uma redução da taxa de rentabilidade esperada para ativos daquela categoria.
Podemos então analisar estes dois fatos para entender a razão da elevação do preço das ações na bolsa brasileira. Uma análise, ainda que superficial, nos indica que a perspectiva de curto prazo para o lucro futuro das empresas não é de crescimento expressivo[4]. Não há aumento de consumo por parte dos brasileiros que continuam com renda baixa e alto índice de desemprego[5], não há ganhos expressivos de produtividade, não há reduções expressivas de custos previstas e não há expectativa em relação a valorização dos produtos brasileiros no mercado.
Por outro lado, podemos dizer que um aumento na procura pelo mercado de ações representa uma redução na necessidade de rentabilidade a ser paga para aqueles que aceitam investir em empresas listas da bolsa. Ou seja, essa realocação do capital antes aplicado em investimentos mais conservadores em direção à bolsa de valores significa maior disponibilidade de capital neste mercado, implicando em retornos menores para os investidores neste tipo de ativo e uma necessidade de menores promessas de retorno para as empresas que lançarem suas ações na bolsa. Ou seja, o custo do capital na bolsa de valores está se reduzindo.
E afinal o que isto quer dizer? Muito provavelmente a rentabilidade para aqueles que entram na bolsa a partir deste momento onde os preços estão mais altos será menor do que a rentabilidade que obtiveram os que entraram anos atrás.
Portanto, nossa dica é que os novos investidores tenham parcimônia em relação às expectativas de ganhos com investimentos em bolsa. Lembrem-se que é um mercado com risco e que está vivenciando uma alta demanda, o que tende a diminuir a lucratividade futura a menos que a lucratividade das empresas brasileiras listadas na bolsa volte a crescer.
Nos vemos em breve em um novo painel de educação financeira!
Prof. Dr. André Luiz Medeiros
Prof. Dr. Moisés Diniz Vassallo
Prof. Dr. Victor Eduardo de Mello Valerio
DENARIUS – Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Financeira
Instituto de Engenharia de Produção e Gestão (IEPG)
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI).
O painel de educação financeira é uma parceria do programa Conexão Itajubá com o Grupo Denarius da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI).
https://www.facebook.com/denarius.unifei/
[1] Valor de fechamento do índice em 07/11/2019, dia anterior a exibição deste painel.
[2] Neste artigo faremos esta simplificação para não exigir que entremos em detalhes sobre como o índice e os preços das ações variam quando as empresas distribuem lucros para seus acionistas, ou seja, pagam dividendos. O leitor mais curioso e interessado pode se informar sobre o que acontece com os preços neste caso em: http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/legislacao/deliberacoes/anexos/0600/deli617.pdf
[3] Conforme explicamos no nosso painel de 27 de setembro de 2019 é a taxa básica de juros que o governo paga para tomar dinheiro emprestado dos investidores e tem forte relação com a rentabilidade dos investimentos livres de risco.
[4] Expectativas de maiores lucros no futuro mais distante (longo prazo) também afetam o preço das ações, mas em menor escala.
[5] O mercado de consumo brasileiro é muito relevante para a maioria das empresas listadas no Ibovespa, muito embora algumas comercializem seus produtos no mercado internacional.