A pequena cidade francesa de Lourdes foi o lugar escolhido pela Virgem Maria para aparecer à camponesa Santa Bernadete Soubirous em 1858. E o Dr. Patrick Theillier, quando médico permanente do Santuário e Presidente da Association Médical International de Lourdes, declarou:
“Inicialmente, o trabalho consiste em receber os peregrinos que supõem ter sido beneficiados por uma cura por intercessão de Nossa Senhora de Lourdes. São eles que o dizem e vêm testemunhar esse fato. Eu anoto e procuro investigar se existe a possibilidade de que essa cura seja reconhecida como milagrosa – é a primeira etapa.
A segunda, nos casos que me parecem mais probatórios, início uma pesquisa médica, recolhendo todos os documentos anteriores à cura e, os posteriores, para estar bem seguro de que ela realmente existiu. Devo estudar, com todos os médicos que passam por Lourdes, uma causa dessa cura que possa ser natural ou terapêutica. No total, devo dar a volta em torno da questão, para depois propor tal cura à Igreja, a fim de que ela reconheça o milagre.
Qualquer médico pode entrar na nossa associação. Não pergunto a religião deles. A grande maioria é católica, mas não obrigatoriamente praticante. Eles vêm igualmente para fazer pesquisas ou simplesmente com uma finalidade humanitária de ajudar os doentes.
O primeiro milagre constatado foi o de Catherine Latapie, que era uma mulher de 38 anos. Ela tinha dado à luz quatro filhos e dois já haviam morrido. Na noite de 28 de fevereiro de 1858, sentiu a necessidade de vir à Gruta de Massabielle – onde Nossa Senhora apareceu.
Dois anos antes, ela caíra de uma árvore e teve uma paralisia cubital no braço direito, que a atrapalhava enormemente em suas atividades. Além disso, ela estava grávida e não hesitou em vir durante a noite para assistir à aparição – a décima segunda. Quando tudo tinha terminado, ela subiu na gruta – naquela época era preciso escalar um pouco. E encontrou a fonte em que, três dias antes, Nossa Senhora tinha pedido a Santa Bernadette para lavar-se.
A senhora Latapie colocou a mão e logo em seguida ficou com o uso completo do braço direito. Partindo de volta a pé para casa, a seis quilômetros da gruta, ela sentiu as dores do parto e deu à luz um filho que se chamou Jean Baptiste. Mais tarde, ele tornou-se padre.
Desde então, dezenas de milagres foram reconhecidos oficialmente pela Igreja. Seria bom explicar que é sempre o bispo da diocese, da qual vem a pessoa que foi curada, que reconhece o milagre. Portanto, não é o Papa, nem o Vaticano, e tampouco o bispo da diocese de Tarbes-Lourdes. Pelo mundo inteiro, o bispo local é quem recebe o dossiê reconhecido pela medicina.
No entanto, é bom saber que o número de curas declaradas pela medicina é cem vezes maior do que as reconhecidas pelas autoridades eclesiásticas. Apenas uma cura sobre cem declarações, em média, é reconhecida de modo oficial.
Enquanto médico católico, creio que em cada ser humano existe uma dimensão espiritual que é inerente à sua natureza. Somos criados à imagem e semelhança de Deus e existe em nós uma fonte de vida eterna. Considero que a cura física é um sinal da benevolência e da misericórdia de Deus em relação ao doente, mas que não acontece sem uma cura interior.
No Evangelho, todas as curas são sempre acompanhadas de uma cura interior: ‘Vai, tua fé te curou’; ‘A partir de agora não peques mais’; e assim por diante. A cura é um sinal de restabelecimento total da pessoa, e acredito que em Lourdes seja assim. A cura física é a única visível, a única sobre a qual podemos trabalhar, estudar e precisar, mas todas as curas físicas tocam a pessoa em toda a sua dimensão, seja ela física, psíquica ou espiritual.
Há curas invisíveis aqui e são talvez mais numerosas e importantes: as curas do coração, da alma, do pecado, a reconciliação com Deus, com os outros e consigo mesmo. Assim, acredito que não se pode apenas fixar o lado ‘prodigioso’ do milagre físico – frequentemente maravilhoso, claro –, mas devemos procurar o sentido que está escondido atrás dele: a cura interior.
Acredito que a cura é para todos, não somente reservada a alguns. Caso contrário, seria injusto; poder-se-ia perguntar: por que alguns se curam e outros não? Somos todos chamados a ser curados, cedo ou tarde, das nossas feridas e dos nossos pecados.
É preciso viver na esperança e entender que Deus nos ama, que Ele não está na origem do mal, da doença ou da invalidez. Caso contrário, viveremos como revoltados. É preciso entender que Ele sofreu e deu a sua vida por nós e nos salvou.
O mais importante é a saúde espiritual. É preciso ver essas curas físicas dentro de uma perspectiva de eternidade – como uma antecipação da ressurreição do nosso corpo.”
Pois é, como em toda profissão, tem médico que é bom de serviço e bom de cabeça também!
Ø Paulo R. Labegalini
Cursilhista e Ovisista. Vicentino em Itajubá. Engenheiro civil e professor doutor do Instituto Federal Sul de Minas (Pouso Alegre – MG).