Em um cenário econômico marcado por incertezas globais e desafios internos, o Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou recentemente mais um aumento da taxa Selic, a taxa básica de juros da economia brasileira, que alcançou 15% ao ano, um recorde em 20 anos. Para explicar o impacto dessa decisão e o papel do Copom, o professor André Medeiros, coordenador do Grupo Denarius, trouxe esclarecimentos sobre o tema.
O Copom, segundo Medeiros, é o órgão do Banco Central responsável por definir a política monetária do país, com o objetivo principal de garantir o poder de compra da moeda. “É como em uma casa: quando o orçamento aperta, alguém decide o que pode ou não ser gasto. O Copom faz isso com a economia, regulando a taxa de juros para controlar a inflação”, explicou, comparando o comitê a um gestor doméstico que corta gastos supérfluos.
A recente alta da Selic, de acordo com o especialista, é uma resposta a um cenário econômico “caótico” no Brasil e no mundo. Conflitos internacionais, como as guerras entre Ucrânia e Rússia, Israel e Palestina, e tensões envolvendo Irã, além de barreiras comerciais impostas por países como os Estados Unidos, têm gerado instabilidade global. Internamente, a inflação, que já atingiu 5% no primeiro semestre – valor equivalente à meta anual – reflete uma economia desorganizada. “A inflação está corroendo o poder de compra. Com R$ 100, antes comprávamos três pacotes de arroz; agora, apenas dois e meio”, ilustrou Medeiros.
O aumento da taxa de juros, embora vise conter a inflação, tem impactos diretos nas operações financeiras, como empréstimos e financiamentos. “Quando a Selic sobe, os empréstimos ficam mais caros, desencorajando o consumo e reduzindo a atividade econômica. Isso força os comerciantes a baixarem preços para escoar estoques, o que ajuda a controlar a inflação”, explicou. No entanto, ele alerta para o “custo social” dessa medida, como demissões e redução da lucratividade das empresas, que podem agravar a situação econômica de curto prazo.
Medeiros destacou que a independência do Banco Central é crucial para essas decisões, mesmo diante de pressões políticas. “O Banco Central não pode ceder a interesses do Executivo. Sua função é proteger o valor do dinheiro, e o aumento da Selic é uma ferramenta para isso, mesmo que impopular”, afirmou. Ele também criticou a falta de planejamento de longo prazo no Brasil, que, segundo ele, é agravada por uma administração pública ineficiente e gastos que não geram valor. “Estamos sempre focados em ciclos eleitorais, não em um projeto de nação. Isso limita nossa capacidade de crescimento sustentável”, apontou.
Para a população, o especialista recomenda “apertar o cinto”. “É hora de rever o orçamento, evitar dívidas com juros altos e priorizar o essencial. Comprar uma televisão nova, por exemplo, pode esperar se não há dinheiro disponível”, aconselhou. Ele também enfatizou a importância da educação financeira para mudar comportamentos e ajudar as pessoas a lidarem com cenários adversos. “Sem educação de qualidade, não entendemos o impacto dessas decisões econômicas no nosso dia a dia”, alertou.
Sobre o futuro, Medeiros é cauteloso. Com 2026 sendo ano eleitoral, ele prevê que os gastos públicos podem aumentar, priorizando interesses políticos em vez do bem-estar do país. “Não vemos um compromisso com o Estado, mas com governos temporários. Isso é um reflexo da sociedade, que precisa exigir mais responsabilidade”, afirmou. Apesar do cenário desafiador, ele acredita que o Brasil tem maturidade suficiente para evitar crises mais graves, como as enfrentadas por outros países.
O especialista concluiu reforçando a necessidade de informar a população com clareza e sem viés. “Meu papel é trazer a verdade, mesmo que seja dura. Precisamos pensar no curto, médio e longo prazo, não só para nós, mas para as próximas gerações”, finalizou.