No Brasil o principal indicador de inflação é o calculado pelo IBGE e que representa o índice de preços da cesta média de consumo das famílias que possuem renda entre um e quarenta salários mínimos, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo).
Para calcular a evolução dos preços dos itens que compõem a cesta de consumo da maioria das famílias brasileiras, o IBGE precisa, em um primeiro momento, definir o peso de cada item da cesta no orçamento das famílias. Ou seja, definir qual a relevância de cada item que compõe esta cesta. Afinal, não basta medir apenas a variação percentual dos preços em dois períodos diferente do tempo e dizer que a inflação é a média simples destas variações de preços.
Um exemplo simples pode nos fazer entender melhor esta necessidade de ponderação dos itens que compõem o índice de inflação. Pense em dois produtos, um deles o arroz, muito comum na mesa da maioria das famílias brasileiras, e outro o picles em conserva, muito pouco comum na alimentação do brasileiro. Suponha agora que do mês 1 para o mês 2 os únicos preços que variaram foram os preços do arroz que subiu 10% e o do picles que reduziu 10%. Se considerarmos que inflação no período é a média simples entre as duas variações, então teríamos uma inflação de 0%. Mas quão representativo isto seria da realidade no custo de vida do brasileiro? Muito pouco, certo? Por isso, é muito importante que os pesos de cada item sejam bem definidos. Neste caso provavelmente o peso do arroz seria bem maior o que deixaria a inflação no período muito mais próxima de 10% do que de 0 ou -10%[1].
E como são definidos os pesos de cada item de consumo no principal índice de preços ao consumidor do Brasil, o IPCA? É por meio da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que o IBGE mede o padrão de consumo das famílias. A POF é uma pesquisa complexa, profunda e muito abrangente. Para a realização da POF, pesquisadores do IBGE visitam milhares de domicílios no Brasil (57.920 na última edição de 2017-2018) em todas unidades da federação. Durante o período de pesquisa o entrevistador coleta todas informações de rendimento, e despesas/consumo dos moradores do domicílio aos mínimos detalhes. Sendo possível assim definir o padrão médio de consumo do brasileiro, para milhares de itens que, posteriormente, são agrupados em 457 subitens e 9 grandes grupos.
A Figura 1 apresenta o peso de cada um dos grandes grupos na composição da inflação.
Conhecendo, a importância de cada grupo no cálculo do IPCA já é possível fazer uma análise mais apurada, dos resultados que vêm sendo apresentados nos últimos meses e que indicam para o ano de 2020 uma deflação acumulada de cerca de -0,2%.
A Figura 2 apresenta que esta deflação está sendo puxada fortemente pelo item de transportes, o de maior peso no cálculo do IPCA, enquanto outros itens como alimentação e bebidas e educação estão apresentando inflações expressivas da ordem de 4% no acumulado dos primeiros 5 meses do ano.
A pergunta que resta ser respondida neste momento de pandemia é: Qual a importância para sua família, neste momento, de itens de transportes como gasolina, etanol e passagem aérea? Esses foram os campeões na redução de preços. Você está viajando como antes e o peso desses itens continuam tão relevantes assim na sua cesta de consumo médio? Ou itens de alimentação no domicílio, um dos campeões de aumento de preços, é que estão ganhando importância nas suas despesas?
Você deve estar se perguntando então: Quando o IBGE irá corrigir os pesos para o cálculo do IPCA realizando uma nova POF? Não sabemos responder, mas, com certeza, será apenas quando não estivermos mais falando tanto de Covid-19. Para se ter uma ideia, a POF mais recente realizada entre 2017 e 2018 que ainda nem teve todos os seus resultados divulgados, veio para substituir a POF de 2008-2009, ou seja, ocorreu com um intervalo de 9 anos.
É justo que esta pesquisa tão cara e trabalhosa ocorra somente a cada 5 ou 10 anos, como o IBGE planeja. Afinal os hábitos de consumo não mudam tanto assim de uma hora para outra. A não ser que um vírus letal nos obrigue.
Neste sentido o nosso recado é: analise o índice de inflação de uma forma mais detalhada. Os pesos importam e são relevantes, mas eles podem não representar a realidade, considerando o cenário que estamos vivemos.
Até o nosso próximo painel de Educação Financeira.
Prof. Dr. André Luiz Medeiros
Prof. Dr. Moisés Diniz Vassallo
Prof. Dr. Victor Eduardo de Mello Valerio
DENARIUS – Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Financeira
Instituto de Engenharia de Produção e Gestão (IEPG)
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI).
O painel de educação financeira é uma parceria do programa Conexão Itajubá com o Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Financeira (DENARIUS UNIFEI).
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[1] O exemplo aqui apresentado tem apenas fins didáticos. Os autores têm ciência de que as variações que compõem índices de preços são muitas vezes do tipo geométrica e não aritmética, no entanto, a importância dos pesos continua relevante.