De fato, se Padre Lourenço da Costa Moreira não tivesse acordado, certo dia, acabrunhado com o pensamento de que sua paróquia deveria ser em local mais propício para o crescimento, Itajubá ainda seria em Delfim Moreira, lugar de incontestável beleza, mas de precárias condições topográficas. Partindo do princípio de que na História não existe “se”, era exatamente assim que deveria ter sido. O “Encontro” que remonta ao início da história de Itajubá foi o episódio da disputa travada entre as povoações do arraial de Nossa Senhora de Soledade de Itagybá, atual Delfim Moreira e arraial de Boa Vista de Itajubá pela posse da imagem de Nossa Senhora da Soledade. A tentativa de transferência da imagem e paramentos religiosos para a nova paróquia foi frustrada pelos fiéis que permaneceram em Delfim Moreira. Os paramentos vieram e a imagem de Nossa Senhora da Soledade ficou, sendo providenciada uma réplica para Boa Vista de Itajubá. Por muitos anos os itajubenses se emocionaram com a tradição de uma carreata entre as duas cidades, que levava e trazia a imagem da padroeira por ocasião de sua festa, acontecimento que fazia recordar o início da história de Itajubá e aumentava o carinho dos fiéis por Nossa Senhora da Soledade.
Padre Lourenço foi tão intensamente seduzido pela natureza exuberante e pela vista encantada que rodeava o rio Sapucaí que aqui acampou com os fiéis, certo de que não encontraria lugar mais adequado e promissor para estabelecer sua paróquia. Se (outro “se”) o padre, nos dias atuais, visitasse seu fascinante recanto, constataria que seu vale já não é tão verde e “suas várzeas já não têm tantas flores”, alto preço que pagamos pelo progresso que merecemos. Arrancamos muitas árvores, alargamos as ruas para que coubessem mais carros, estreitamos as calçadas, demolimos prédios antigos, sujamos os rios e abrimos buracos sem fim. Entretanto, essa moderna situação caótica não é privilégio de Itajubá, mas de quase todas as cidades que sofrem com o uso desordenado dos recursos naturais e com o desenvolvimento desenfreado a que nos expomos sem o perceber, pois os efeitos colaterais geralmente se manifestam mais tarde.
Nem tudo está perdido, sempre há esperança, deverá existir algum meio para conciliar progresso e natureza. Haveremos de encontrar uma solução para o colapso do trânsito e a ausência do verde em nossas ruas. Agora, neste 19 de março, não queremos cultivar o pessimismo, ao contrário, torcemos para que a cidade dê certo, afinal, somos seus filhos. Aquecemos e abrimos nossos corações para homenagear a Itajubá do presidente Wenceslau Braz, do Grande Hotel, do Colégio das Irmãs, da Fábrica de Armas, da “mulher de bronze”, dos famosos corais e velhos carnavais, a Itajubá que já tem parque com lago e tudo.
O lugar escolhido pelo padre Lourenço permanecerá. Se (último “se”) a vida se tornar insustentável pelos danos que causamos ao paraíso primordial, não adiantará procurar outro lugar para morar, uma vez que o planeta todo estará comprometido. Necessário será empreender uma nova busca como fez o padre, dessa vez não para encontrar outro sítio, mas sim para reaprender o caminho de volta, aquele que nos faz aproveitar as lições do passado, como resgatar o intuitivo olhar com que o padre Lourenço enxergou Boa Vista de Itajubá, como cultivar o verde de nosso vale, as flores de nossos canteiros e o amor pela cidade que nos serviu de berço e sempre nos abriga.