Sempre achei bonito, como sempre acho, quando minha enteada se refere à casa e ao endereço como “Morada”, linguajar de Portugal. É porque casa é demasiadamente físico, lembrando paredes e teto, já morada é uma palavra que tem uma elegância, “quem entender a linguagem entende Deus” (Adélia Prado). Enfim, Morada tem uma conotação de vida, de sentimentos sobre onde se mora.
Bom, lendo há dias uma crônica de Rubem Braga (não faço outra coisa ultimamente), fiquei comovida com o que ele dizia sobre casas e moradias. Dizia ele para um corretor que mostrasse qualquer apartamento que fosse, menos aquele que ao abrir uma janela, ele desse de cara com uma parede. Não, isso nunca. Podia até ser a vista para uma rua movimentada, barulhos do trânsito e tal, mas uma parede não. Não precisava ser uma vista que desse para o mar, isso era luxo demais, mas que se visse o céu. Isso sim.
Agora falo de outro Rubem, o Rubem Alves de quem li algo há mais de vinte anos. Contava ele que morou em certo lugar onde a janela de seu quarto dava para um terreno baldio, com monturos de lixos, e aquela visão era de amargar. Pois foi então que ele pouco a pouco transformou aquele terreno num jardim, com arvoredos e flores. O terreno não era seu, porém isso não importava. O que importava era a beleza, era abrir a janela e enxergar algo belo como plantas e flores.
Isso me fez lembrar de minha avó, mãe de minha mãe, que a vida toda morou em casas alugadas. Só que ela sempre deixava cada casa com um quintal que mais parecia um jardim de Versailles de tão florido e lindo, sem falar da grama de tufos onde ela quarava aqueles lençóis branquinhos de antigamente. Minha mãe também era assim, amante das plantas e flores. Nosso quintal era habitado pelos antúrios (milhares), espirradeiras, bicos de papagaio, romãzeiras e parreiras. Ela dizia que adorava a sombra das parreiras (Como falo de minha mãe).
Só que em seus últimos anos de vida, ela queria porque queria uma casa com varanda que desse para a rua para ela se distrair. Eu quebrei a cabeça tentando achar uma solução, mas não foi possível. Ela já estava doente e não encontrava consolo em quase nada. Mas eu carrego esta culpa. Espero que no Céu haja varandas das mais belas.
Estamos construindo uma casa afastada que tem uma vista bonita, mas não as montanhas que vejo daqui. Mudanças são necessárias, perdas são inevitáveis. Se tiver uma vista para o céu, como disse Rubem Braga, tá bom. Isso tem.
Voltando ao início do texto, falo em “Morada”, e agora me vem à mente um dos livros que compõem as Obras Completas de Santa Teresa de Ávila que se chama “Moradas” se referindo ao nosso interior, à nossa alma, um castelo onde Deus habita. Esta Morada devemos cuidar muito bem porque é o lugar onde Deus habita quando nos visita