Escolhi falar sobre os hábitos porque somos muito diferentes uns dos outros e dificilmente alguém confessa estar errado. Vendo alunos circulando à minha volta, percebo que se vestem segundo o gosto de cada um, se comportam com os próprios hábitos e ninguém se envergonha do que faz. Até aí, tudo bem, pois eu também já fui assim, mas há manias muito estranhas, como neste conto que tentarei criar:
Na época dos escravos, um patrão maldoso resolveu dar um grande castigo ao empregado capturado na fuga e enviou-lhe à ilha deserta com uma pesada corrente presa nas pernas. Não havendo como fugir e mal conseguindo andar, o pobre escravo passava os dias tentando arrebentar a corrente com pedras.
Dois anos se passaram e o empregado sobrevivia comendo frutas e batendo na corrente, até que uma embarcação chegou no lugar. Ao encontrar o escravo, um dos tripulantes perguntou-lhe:
– Quem é você e o que faz acorrentado nesta ilha deserta?
– Eu era escravo, meu senhor. Fui deixado aqui para morrer na solidão, mas tenho rezado e pedido à Virgem Maria que eu não pague uma pena mais pesada do que mereço.
– Bem, acho que suas orações foram ouvidas porque somos contra a escravidão e iremos colocá-lo em liberdade. Vamos embora, ainda temos mais três dias de viagem!
– E a corrente, pode cortá-la?
– Infelizmente não temos ferramentas a bordo. Isso só será possível no porto.
– Então, permita-me levar algumas pedras e continuar tentando?
– Como quiser.
Ora, parece estranho que o ex-escravo não quis se libertar imediatamente das pedras, não? Mas, pensando bem, após dois anos nessa vida – dia e noite sem fazer outra coisa –, até dá para afirmar que o fez por força do hábito! E quase tudo na vida ‘funciona’ assim: faço porque sempre fiz; continuo fazendo porque já acostumei; não mudo porque não tenho vontade etc.
Dizia Einstein: “É mais fácil romper um átomo do que quebrar um hábito!” Concordo que é uma afirmação forte, mas, independentemente de ser verdade ou mentira, alguns hábitos nos fazem meio escravos também. Há maníacos compulsivos que gastam muito em tratamentos; há viciados em horóscopos que podem perder o Céu se não confiarem mais na oração; há supersticiosos que procuram satisfazer seus ‘grilos’ e perdem tempo com isso; e há o pior hábito de todos: não rezar!
Quem não reza, pode se apegar a qualquer outra coisa que estará fazendo uma péssima troca. E, quem reza, tem o privilégio de poder ‘praticar esse hábito’ em qualquer lugar, porque até um rápido Sinal da Cruz é uma oração. Mas não é aconselhável perder a oportunidade de rezar com calma num ambiente apropriado, por isso, faço orações toda manhã, antes de sair de casa, garantindo uma parte do meu dever cristão no dia. E quem acha que isso pouco adianta, aconselho que leia esta outra história:
Uma noviça recém-chegada ao convento procurou a superiora e disse-lhe:
– Querida madre, ainda não entendi por que recitamos tantas orações diferentes se não iremos conseguir decorá-las nunca!
Antes de responder, a madre pediu-lhe que fosse à gruta e trouxesse-lhe água num velho cesto de vime. A noviça estranhou a tarefa, mas apanhou o recipiente e se dirigiu à gruta. Mal enchia o cesto e a água vazava quase toda. Quando chegou à madre, foi logo dizendo:
– Onde despejo a água? Só sobrou um restinho!
Foi, então, orientada a jogá-la numa linda roseira e ir buscar mais para aguar as outras flores do jardim. Vendo que a água se perdia no caminho, a noviça corria cada vez mais, tentando aproveitar o máximo que pudesse. Na sexta viagem, já exausta e toda molhada, ela falou ofegante à madre:
– Até quando tenho que fazer isso com este cesto vazado e não com um balde novo?
– Até você compreender a transformação que está havendo com o cesto!
– Madre, o cesto está ficando cada vez mais limpo. Só isso!
– Exatamente, minha filha. Isso também acontece quando você reza: mesmo sem memorizar tudo o que recebe, sua alma vai se purificando!
Pois é, quando se trata de valores espirituais, nossos hábitos podem e devem ser melhorados a cada dia. Eu sempre ouvia o saudoso Pe. José Maria dizendo: “Ninguém vai para o céu sozinho, como ninguém vai para o inferno sozinho”. Pensando nisso, não é melhor adotarmos os hábitos daqueles que querem se salvar? E todo processo de santidade começa pela oração.
Jesus pregou isto: “O Reino de Deus é como um grão de mostarda que, ao ser semeado na terra, é a menor de todas as sementes. Quando semeado, cresce e se torna maior do que todas as hortaliças, e estende ramos tão grandes, que os pássaros do céu podem abrigar-se à sua sombra”. Bem, quem tiver o hábito de plantar o bem e colher bons frutos, aconselho a não mudar, porque essa pessoa chegará um dia diante do Senhor com a alma limpa e sem nenhuma corrente que a impeça de se salvar.
Bendito seja Deus que nos deu o ‘hábito’ de sempre nos reunirmos no amor de Cristo.
Ø Paulo R. Labegalini
Cursilhista e Ovisista. Vicentino em Itajubá. Engenheiro civil e professor doutor do Instituto Federal Sul de Minas (Pouso Alegre – MG).
Livros do autor:
1. Gotas de Espiritualidade – Editora Bookba (à venda na Amazon, Americanas, Shoptime, Magalu…) – mensagens diárias de fé e esperança, com os santos de cada dia.
2. Pegadas na Areia – Editora Prismas / Editora Appris
3. Histórias Infantis Educativas – Editora Cléofas
4. Histórias Cristãs – Editora Raboni
5. O Mendigo e o Padeiro – Editora Paco
6. A Arte de Aprender Bem – Editora Paco
7. Minha Vida de Milagres – Editora Santuário
8. Administração do Tempo – Editora Ideias e Letras
9. Mensagens que Agradam o Coração – Editora Vozes
10. Projetos Mecânicos das Linhas Aéreas de Transmissão (coautor) – Editora Edgard Blücher
11. Mecânica Geral – Estática (coautor) – Editora Interciência