Seguindo as experiências vividas pelos antigos mongóis, pelos índios americanos e pelos Guaicurus do pantanal. Estudando as técnicas dos horsemanchips, ouvindo estórias dos velhos cavaleiros da nossa região, dos gaúchos dos Pampas, pude finalmente sentir o que é interagir com os cavalos. Foi uma alegria imensa porque buscava isso desde criança. Quando moleque, andava pelos pastos correndo atrás de cavalos para pega-los e só quando os encurralávamos tínhamos sucesso. Imaginem a raiva que sentíamos dos cavalos e descontávamos tudo neles. Eles tinham que “pagar” por ter nos feito perder horas correndo atrás deles no pasto, que era imenso. Não sabíamos que eles fugiam porque nos viam como predadores, para nós eles deviam ser submissos e nos obedecer. Para eles, éramos filhotes de homem aprendendo a caçar, ainda mais que sabiam que sofreriam depois de apanhados. Eu não me interagia com os cavalos apesar de conviver muito com eles. Eu não sabia que não sabia me interagir com eles.
Hoje, os cavalos andam atrás de mim e quando me vêem relincham de satisfação. Eles gostam da minha companhia, de trabalhar comigo. Quando competem, correm para ganhar com bastante franqueza. Tudo isso porque consigo interagir com eles. Não represento nenhuma ameaça, como nos tempos em que éramos mais inimigos que amigo deles.
Quando atingimos este ponto aprendemos que podemos superar nossos limites buscando ajuda de outro ser, formando com ele um conjunto neural, onde todas as ações ocorrem automaticamente, um dialogo instantâneo de toques condicionados, uma verdadeira dança. Somos seres gregários, assim como os cavalos, dependemos do toque, dos gestos e quando estamos em contato temos a oportunidade de interagir, ver e sentir o outro por dentro e aí a linguagem se torna corporal, gestual, assim como nos cavalos. Somos muito parecidos com eles embora pertencemos a uma outra escala na cadeia alimentar. Interagir com os cavalos é interagir com a natureza, sentir a harmonia entre os seres e sobretudo, entender a relação hierárquica na cadeia alimentar e qual o papel do cavalo nesta pirâmide. A relação é poderosa. O caçador se torna mais forte e veloz e a presa vira caçador, tudo isso em um só bloco, juntos, ou melhor, interligados. É claro que as caçadas e as guerras foram substituídas pelos esportes e pelas cavalgadas e pessoas treinam anos para atingir e superar metas sem depender unicamente de si mesmo e sim contando com a parceria de um ser independente, comunicativo e poderoso.
Interatividade depende de franqueza, de atitudes consistentes e verdadeiras. Em nosso mundo as relações são superficiais, existem mais conflitos que interação e é neste ponto que a relação com cavalos buscando a interatividade nos ensina a conviver melhor com seres de nossa própria espécie. Não se consegue que o cavalo dê tudo de si em uma prova sem uma interação forte e isso só ocorre quando existe confiança mútua caso contrário sempre vai faltar aquela sobre força necessária para a vitória. Não é a mesma coisa, por exemplo, de você acionar o nitrogênio num motor de um carro de corrida para ganhar aquela força extra. Se o carro tivesse sentimento e não gostasse de você, poderia não ter vontade de vencer e engasgaria como nos desenhos animados onde os carros tem vida. Sempre dependemos de nós mesmos e do que podemos construir para nos impulsionar mais podem estar certos, contar com o apoio de outro ou de outros é enriquecedor para superar qualquer recorde.
A convivência com cavalos é uma escola que ensina a viver superando limites e a atingir metas. Não aprendemos isso nas nossas escolas tradicionais e a sociedade também pouco nos ensina a este respeito. Estamos cada vez mais fadados ao individualismo onde nossas metas principais estão ligadas ao consumo de bens materiais e interagir fica difícil se você não tem dinheiro. O cavalo não cobra para interagir e ainda por cima te ensina a interagir com as pessoas sem ter que “comprá-las”.
Dito tudo isto, agora posso indicar o primeiro passo nesta longa escalada em busca da interatividade com os cavalos que é simplesmente mudar o foco de visão. Deixar de focar em si mesmo e passar a focar o outro, esperando pacientemente o que ele tem a nos ensinar. Não é assim tão fácil mais como é uma escola, uma lição sempre vem depois da outra.
Fonte: Carlos José Gorgullho