Aqui estou rodeada de café, livros, os preferidos, aqueles a que sempre torno para reler preciosidades e me encantar. Para variar me debruço sobre a poesia que permeia os escritos de Saramago.
Como ontem já havia lido algo a respeito de sonhos que não se concretizam e também como acredito que muitas pessoas, inclusive a autora que escreve este artigo, devam carregar pelo menos um sonho que não passou de sonho, ouso contar a história que Saramago contou: menino nos anos 30, como todos os outros, gostava de pescar. Pobre que era, tinha uma “cana vulgar com o anzol, a chumbada e a boia de cortiça atados ao fio de pesca”, nada de artefatos modernos. Nunca havia pescado mais do que alguns poucos peixinhos, “capturas” simples.
A história é grande, mas para resumir, já findava o dia, quando o menino sentiu uma violenta puxada indicando que um grande peixe mergulhava ferozmente tentando se livrar do anzol e quase arrancando a cana de suas mãos. Saramago puxou a cana, foi puxado, mas a luta não durou muito, logo o peixe sumiu levando tudo, anzol, boia e a tal da chumbada. Desesperado, sem conseguir acreditar que o maior peixe do mundo havia escapado de suas mãos, ficou em estado de choque até que lhe ocorreu voltar à casa da avó e regressar para ajustar contas com o monstro. Acontece que a casa dos avós ficava a mais de um quilômetro do rio onde se encontrava, mas ele tinha a disparatada esperança de que o peixe ficasse ali à espera. Contra toda a razão e bom senso, disparou a correr, atravessou olivais para fazer atalhos, irrompeu pela casa da avó preparando outra cana e apetrechos. A avó perguntou-lhe se ele realmente acreditava que o peixe ainda estaria lá, mas ele não quis ouvir, não podia ouvir.
Voltou, o sol já ameaçava sumir, lançou o anzol e esperou. Só silêncio. Um silêncio de que ele nunca se esqueceu. Ali ficou até tarde quando por fim, com a tristeza na alma, enrolou a linha e voltou para casa. Aquele peixe certamente não morreria fácil, mas um dia seria pego por alguém. Entret