A deflagração da I Guerra Mundial, em agosto de 1914, levou à mobilização de milhões de jovens e adultos, nos países envolvidos; como o Escotismo já estava bem difundido na Europa, não é de se estranhar que muitos daqueles jovens que, entusiasmados, correram ao alistamento fossem Escoteiros.
Nos quatro anos do conflito, antigos Escoteiros e Chefes fizeram parte dos milhões de mortos, feridos e mutilados. Dos participantes do acampamento de Brownsea, quatro morreram na guerra e dois outros pouco depois, por causas associadas ao conflito (um por doença e outro por efeitos de envenenamento por gás). B-P e Lady Olave trabalharam em um posto de descanso das tropas em Étaples, ajudando no processo de recuperação dos combatentes para serem reenviados ao combate.
Quanto aos Escoteiros, ainda muito jovens para serem alistados e mandados ao front, deram sua contribuição na frente doméstica: trabalharam na venda de bônus do governo; constituíam equipes de coleta de materiais que pudessem ser usados no esforço de guerra, como metais, borracha, papel e papelão; atuaram como mensageiros e como vigilantes do ar, da costa e das linhas de comunicação. Um dos cartazes de propaganda do governo britânico, à época, perguntava: “Você está nisto?”, e mostrava um soldado, um operário industrial, uma enfermeira (participação da mulher) e um Escoteiro, significando a necessidade do engajamento de toda a população no esforço de guerra.
Um pouco antes do início das hostilidades, em 1913, B-P, temeroso da possibilidade de invasão da Grã-Bretanha, publicou um livrinho chamado Marksmanship for boys, contendo as etapas da especialidade de Atirador, que poderia ser útil para fazer frente a um desembarque alemão.
O caso de Jack Cornwell foi inserido nas edições do Escotismo para rapazes a partir de 1916. Na batalha da Jutlândia (31 de maio – 1º de junho de 1916), de resultado incerto devido às perdas de navios pelos britânicos e pelos alemães, o jovem Jack Cornwell, de 16 anos, antigo Escoteiro, era apontador numa das torres de artilharia do cruzador Chester. O navio recebeu fogo de quatro cruzadores alemães, e sofreu sérios danos. Toda a equipagem de sua peça estava morta ou ferida, e Cornwell mesmo estava ferido no peito; ainda assim, manteve-se no seu posto até o Chester conseguir sair da linha de fogo. Morreu no hospital na manhã seguinte. Pela bravura em combate, foi a terceira pessoa mais jovem a receber a Victoria Cross, e a Associação Escoteira do Reino Unido instituiu a medalha Jack Cornwell para agraciar os membros do Movimento que tivessem praticado feitos que exigem excepcional bravura.
Com o término da guerra e a desmobilização dos ex-combatentes, estes precisavam ser reintegrados à vida normal em sociedade. Para isto, o Escotismo mostrou ser de grande utilidade: os jovens que haviam sido Escoteiros reuniam-se e faziam juntos coisas que fossem úteis no processo de reconstrução. Essa atividade, na qual, além de se apoiarem mutuamente, os jovens se percebiam úteis à sociedade, permitiu-lhes uma recuperação mais rápida dos traumas psíquicos do combate. B-P, percebendo a importância desse trabalho, tratou de estruturar um Ramo que atendesse a esses jovens adultos, velhos demais para serem Escoteiros, mas não tão velhos que não se pudessem beneficiar do método. Essa é a origem do Ramo Pioneiro.
Nas décadas de 1920 e 30, instalaram-se regimes que tinham como premissa a tutela e o total controle da população em proveito do Estado: o comunismo soviético, o nazismo alemão e o fascismo italiano, com seus ecos em países como Espanha, Portugal, Japão e China. Especialmente na Alemanha, Itália e União Soviética, o Escotismo foi banido e substituído pelas organizações juvenis do regime: na Itália, os Balillas; na Aelmanha, a Juventude Hitlerista; e na União Soviética, os Jovens Pioneiros e o Komsomol. Em Portugal salazarista e na Espanha franquista, o Escotismo tinha a concorrência da Mocidade Portuguesa e da Frente da Juventude.
Os movimentos juvenis partidários tinham como característica aliar as atividades físicas e de vida em equipe no campo (semelhantes às do Escotismo) à doutrinação partidária e aos critérios de “aceitabilidade” do regime. O Escotismo era incompatível com semelhantes regimes por ser pacifista e propor uma fraternidade mundial.
Quando a Segunda Guerra Mundial começou, novamente os Escoteiros responderam ao chamado, os adultos alistando-se, os jovens atuando na frente doméstica, em tarefas semelhantes às de seus pais na guerra anterior. A Segunda Guerra Mundial fez nascer, de forma organizada, a Defesa Civil, e o Movimento Escoteiro participou ativamente desse nascimento na Grã-Bretanha, sob os bombardeios alemães. Os Escoteiros do Ar preparavam os jovens para ingressar nas Air Training Units, que poderiam habilitá-los ao alistamento na Royal Air Force. Em países coupados, como Polônia e França, os antigos Escoteiros envolveram-se nas atividades de resistência ao invasor. Entre vários antigos Escoteiros que se destacaram no conflito, pode-se citar o Comandante de Esquadrão Guy Gibson, que, liderando o Esquadrão 617, executou a incursão dos “Destruidores de represas (Dam busters)”, em 17 de maio de 1943, e que foi condecorado com a Victoria Cross; morreu no retorno de uma missão de bombardeio a Bremen, em setembro de 1944.
Com o fim da guerra e a derrota do nazismo e do fascismo, o Movimento Escoteiro ressurgiu e foi ativo participante na reconstrução dos países devastados pela luta. Décadas depois, quando os países satélites da União Soviética, como Polônia, Tchecoslováquia, Hungria e Romênia abriram mão do “socialismo real”, o Escotismo também renasceu.
O que fez o Escotismo sobreviver a tantas turbulências? Fundamentalmente, sua independência ideológica, baseada na liberdade de pensamento e de escolha e no acolhimento a todas as pessoas, independentemente de etnia, credo religioso ou cor política