Um debate fundamental pede passagem: a esterilização dos recursos do país através do sistema de intermediação financeira, que drena em volumes impressionantes recursos que deveriam servir ao fomento produtivo e ao desenvolvimento econômico. Os números são bastante claros, e conhecidos, e basta juntá-los para entender o impacto.
Loja em Joinville. A prestação que “cabe no bolso” está em letras grandes. Por obrigação legal, colocam o valor final e juros, bem pequenos: paga-se mais do dobro, juros de 122%. Permite comprar hoje, mas trava-se a capacidade de consumo por dois anos. O produtor recebe pouco, e pouco poderá investir. E o consumidor pode comprar pouco, pelo peso dos juros. É a chamada economia do pedágio, que trava o sistema produtivo, tanto do lado do produtor como do consumidor, em proveito do intermediário.
Comecemos pelas taxas de juros ao tomador final, pessoa física, praticadas no comércio, os chamados crediários. A ANEFAC (Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade) traz os dados de junho 2014:
Fonte: ANEFAC,http://www.anefac.com.br/uploads/arquivos/2014715153114381.pdf, 2014
Antes de tudo, uma nota metodológica: os juros são quase sempre apresentados, no Brasil, como “taxa mês”, como na primeira coluna acima. É tecnicamente certo, mas comercialmente e eticamente errado. É uma forma de confundir os tomadores de crédito, pois ninguém consegue calcular mentalmente juros compostos. O que é usado mundialmente é o juro anual que resulta. O Banco Itaú, por exemplo, apresenta no seu site as taxas de juros apenas no formato mensal, pois ao ano apareceriam como são, extorsivos. Na foto mais acima vemos a TV oferecida com taxa de juros de 6,87% ao mês, e aparece em letras miúdas, por obrigação legal, o juro real ao ano de 122%, literalmente um assalto.
A média de juros praticadas nos crediários, de 72,33%, significa simplesmente que este tipo de comércio, em vez de prestar decentemente serviços comerciais, se transformou essencialmente num banco. Aproveita o fato das pessoas não entenderem de cálculo financeiro, e de disponibilizarem de pouco dinheiro à vista, para as extorquir. Aqui, o produtor de “Artigos do Lar”, ao cobrar juros de 104,89% sobre os produtos, trava a demanda, pois ficará represada por 12 ou 24 meses enquanto se paga as prestações, e trava o produtor, que recebe muito pouco pelo produto. É o que temos qualificado de economia do pedágio. Ironicamente, as lojas dizem que “facilitam”. No conjunto do processo, a capacidade de compra do consumidor é dividida por dois, e a capacidade de reinvestimento do produtor estanca.
Os consumidores não se limitam a comprar pelo crediário, cuja taxa média de 72,33% aparece reproduzida abaixo na primeira linha. Usam também cartão de crédito e outras modalidades de mecanismos financeiros pouco compreendidas pela imensa maioria dos consumidores.
Fonte: ANEFAC,http://www.anefac.com.br/uploads/arquivos/2014715153114381.pdf, 2014
Tomando os dados de junho 2014, constatamos que os intermediários financeiros cobram também 238,67% no cartão de crédito, 159,76% no cheque especial, 23,58% na compra de automóveis. Os empréstimos pessoais custam na média 50,23% nos bancos e 134,22% nas financeiras. Estamos deixando aqui de lado a agiotagem de rua que ultrapassa os 300%.
Note-se que a Abecs (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços) considera que o juro médio sobre o cartão é de 280%, portanto bem acima da avaliação da Anefac. A Abecs considera que 50,1% do crédito para consumo é feito no cartão, 23,5% no crédito consignado, 13,1% no crediário de veículos, e 13,3% “outros”. Trata-se, no caso dos cartões, de cerca de 170 bilhões de reais. É importante lembrar que mesmo sem entrar no crédito do cartão, tipicamente uma loja tem de pagar cerca de 5% do valor das compras ao banco, além do aluguel da máquina. Estes 5% podem ser menos para grandes lojas com capacidade de negociação com o sistema financeiro, mas de toda forma trata-se de um gigantesco imposto privado sobre a metade do crédito de consumo, reduzindo drasticamente a capacidade de compra do consumidor.
A Abecs considera que esta carteira “está sendo responsável por fomentar o crédito ao consumidor no país”. É uma forma positiva de apresentar o problema, mas se fomenta o crédito, e não o consumo. No caso da frequente entrada no crédito rotativo, as pessoas pagarão três ou quatro vezes o valor do produto. Miguel de Oliveira, diretor da Anefac, resume bem a situação: “A pessoa que não consegue pagar a fatura e precisa parcelar, ou entrar no rotativo, na verdade está financiando a dívida do cartão de crédito com outro tipo de crédito. O problema é que essa dívida não tem fim. As pessoas acabam não se dando conta dos juros que terão que pagar.”(DCI, B1, 20/08/2014)
Obviamente, com estas taxas de juros, as pessoas, ao fazer uma compra a crédito, gastam mais com os juros do que com o próprio valor do produto adquirido. Costuma-se apresentar apenas a taxa de endividamento das famílias, próxima de 30%, o que não é informação suficiente, pois aqui as famílias não só se endividam muito como se endividam muito comprando pouco. A conta é evidente: em termos práticos, pagam quase o dobro, às vezes mais. Dito de outra forma, compram a metade do que o dinheiro deles poderia comprar, se fosse à vista. Isto que a compra à vista já inclui os lucros de intermediação comercial.
Não é o imposto que é o vilão, ainda que o peso dominante dos impostos indiretos só piore a situação: é o desvio da capacidade de compra para o pagamento de juros. As famílias estão gastando muito mais, resultado do nível elevado de emprego e da elevação do poder aquisitivo da base da sociedade, mas os juros esterilizam a capacidade de dinamização da economia pela demanda que estes gastos poderiam representar. Um dos principais vetores de dinamização da economia se vê travado. Gerou-se uma economia de atravessadores financeiros. Prejudica-se as famílias que precisam dos bens e serviços, e indiretamente as empresas efetivamente produtoras que vêm os seus estoques parados. Perde-se boa parte do impacto de dinamização econômica das políticas redistributivas. O crédito consignado ajuda, mas atinge apenas 23,5% do crédito para consumo (DCI, 2014), e também se situa na faixa de 25 a 30% de juros, o que aparece como baixo apenas pelo nível exorbitante que atingem as outras formas de crédito.
As taxas de juros para pessoa jurídica não ficam atrás. O estudo da Anefac apresenta uma taxa praticada média de 50,06% ao ano, sendo 24,16% para capital de giro, 34,80% para desconto de duplicatas, e 100,76% par conta garantida. Ninguém em sã consciência consegue desenvolver atividades produtivas, criar uma empresa, enfrentar o tempo de entrada no mercado e de equilíbrio de contas pagando este tipo de juros. Aqui, é o investimento privado que é diretamente atingido.
Fonte: ANEFAC,http://www.anefac.com.br/uploads/arquivos/2014715153114381.pdf, 2014
A atividade bancária pode ser perfeitamente útil, ao financiar iniciativas econômicas que darão retorno. Mas isto implica o banco utilizar o dinheiro dos depósitos (além naturalmente da alavancagem) para fomentar iniciativas empresariais, cujo resultado dará legítimo lucro ao investidor, permitindo também restituir o empréstimo. A atividade básica de um banco, que seria de reunir poupanças de depositantes para transformá-las em financiamento de atividades econômicas, saiu do horizonte de atividade destes bancos. A economia, travada do lado da demanda com o tipo de crédito ao consumo visto acima, tanto nos bancos como nos crediários, vê-se portanto igualmente travada do lado do financiamento ao produtor. Prejudica-se assim tanto a demanda como o investimento, os dois motores da economia.
As regras do jogo aqui se deformam profundamente. As grandes corporações transnacionais passam a ter vantagens comparadas impressionantes ao poder se financiar do exterior com taxas de juros tipicamente 5 ou 6 vezes menores do que os seus concorrentes nacionais. Muitas empresas nacionais podem encontrar financiamentos com taxas que poderiam ser consideradas normais, por exemplo pelo BNDES e outros bancos oficiais, mas sem a capilaridade que permita irrigar a imensa massa de pequenas e médias empresas dispersas no país. Não é demais lembrar que na Alemanha 60% das poupanças são administradas por pequenas caixas de poupança locais, que irrigam generosamente as pequenas iniciativas econômicas. A Polônia, que segundo oEconomistmelhor enfrentou a crise na Europa, tem 470 bancos cooperativos, que financiam atividades da economia real. Um dos principais economistas do país, J. Balcerek, comenta ironicamente que “o nosso atraso bancário nos salvou da crise”.
Uma terceira deformação resulta do imenso dreno sobre recursos públicos através da dívida pública. Se arredondarmos o nosso PIB para 4,8 trilhões de reais, 1% do PIB são 48 bilhões. Quando gastamos 5% do PIB para pagar os juros da dívida pública, significa que estamos transferindo, essencialmente para os bancos donos da dívida, e por sua vez a um pequeno grupo de afortunados, quase 250 bilhões de reais ao ano, que deveriam financiar investimentos públicos, políticas sociais e semelhantes. Para os bancos, é muito cómodo, pois em vez de terem de identificar bons empresários e fomentar investimentos, tendo de avaliar os projetos, enfim, fazer a lição de casa, aplicam em títulos públicos, com rentabilidade elevada, liquidez total, segurança absoluta, dinheiro em caixa, por assim dizer, e rendendo muito.
O efeito aqui é duplamente pernicioso: por uma lado, porque com a rentabilidade assegurada com simples aplicação na dívida pública, os bancos deixam de buscar o fomento da economia. Fazem aplicações financeiras em papéis do governo, em vez de irrigar as atividades econômicas com empréstimos. Por outro, muitas empresas produtivas, em vez de fazer mais investimentos, aplicam também os seus excedentes em títulos do governo. A máquina econômica torna-se assim refém de um sistema que rende para os que aplicam, mas não para os que investem na economia real. E para o governo, é até cômodo, pois é mais fácil se endividar do que fazer a reforma tributária tão necessária.
A tabela abaixo mostra que a taxa real de juros para pessoa física (descontada a inflação) cobrada pelo HSBC no Brasil é de 63,42%, quando é de 6,60% no mesmo banco para a mesma linha de crédito no Reino Unido. Para o Santander, as cifras correspondentes são 55,74% e 10,81%. Para o Citibank são 55,74% e 7,28%. O Itaú cobra sólidos 63,5%. Para pessoa jurídica, área vital porque se trataria de fomento a atividades produtivas, a situação é igualmente absurda. Para pessoa jurídica, o HSBC, por exemplo, cobra 40,36% no Brasil, e 7,86 no Reino Unido. (Ipea, 2009)
Comenta o estudo do Ipea: “Para empréstimos à pessoa física, o diferencial chega a ser quase 10 vezes mais elevado para o brasileiro em relação ao crédito equivalente no exterior. Para as pessoas jurídicas, os diferenciais também são dignos de atenção, sendo prejudiciais para o Brasil. Para empréstimos à pessoa jurídica, a diferença de custo é menor, mas, mesmo assim, é mais de 4 vezes maior para o brasileiro.”
Enfrentamos aqui, portanto, uma deformação estrutural do nosso sistema de intermediação financeira. Não há grande mistério no processo: a financeirização mundial, com as suas diversas formas de organização segundo os países e as legislações, adquiriu aqui formas diferentes de travar a economia, dimensão nacional de uma deformação hoje planetária.
A nossa constituição, no artigo 170º, define como princípios da ordem econômica e financeira, entre outros, a função social da propriedade (III) e a livre concorrência (IV). O artigo 173º no parágrafo 4º estipula que “a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.” O parágrafo 5 é ainda mais explícito: “A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular”. Cartel é crime. Lucro exorbitante sem contribuição correspondente produtiva será “reprimido pela lei” com “punições compatíveis”.
O resultado prático é uma deformação sistêmica do conjunto da economia, que trava a demanda do lado do consumo, fragiliza o investimento, e reduz a capacidade do governo de financiar infraestruturas e políticas sociais. Se acrescentarmos a deformação do nosso sistema tributário, baseado essencialmente em impostos indiretos (embutidos nos preços), com frágil incidência sobre a renda e o patrimônio, temos aqui o quadro completo de uma economia prejudicada nos seus alicerces, que avança sem dúvida, mas carregando um peso morto cada vez menos sustentável.
O dreno sobre as atividades produtivas, tanto do lado do consumo como do investimento, é planetário. Faz parte de uma máquina internacional que desde a liberalização da regulação financeira com os governos Reagan e Thatcher no início dos anos 1980l, até a liquidação do principal sistema de regulação, o Glass-Steagall Act, por Clinton em 2009, gerou um vale-tudo internacional.
A dimensão internacional tornou-se hoje mais documentada a partir da crise de 2008. O próprio descalabro gerado e o travamento da economia mundial, levaram a que fossem levantados os dados básicos das finanças internacionais, que curiosamente sempre escaparam doInternational Financial Statisticsdo FMI. Apresentamos em outros estudos o detalhe de cada uma das novas pesquisas que surgiram, e apenas resumimos aqui o seus principais resultados, para facilitar uma visão de conjunto.
Temos assim um sistema planetário deformado, e o Brasil é uma peça apenas na alimentação do processo mundial de concentração de capital acumulado por intermediários financeiros e comerciais. Não temos estudos suficientes nem pressão política correspondente para ter o detalhe de como funciona esta engrenagem no Brasil. No entanto, dois estudos nos trazem ordens de grandeza.
O estudo mencionado doTax Justice Network,desdobra algumas cifras de estoques de capital em paraísos fiscais por regiões. No caso do Brasil, encontramos como ordem de grandeza 519,5 bilhões de dólares, o que representa cerca de 25% do PIB brasileiro. (Primeira linha, quinta coluna de cifras da tabela abaixo).
Assim, o Brasil não está isolado, neste sistema planetário, nem é particularmente corrupto. Mas o conjunto criado é sim profundamente corrompido. Os dados para o Brasil, 519,5 bilhões de dólares em termos de capitais offshore, são de toda forma impressionantes, ocupamos o quarto lugar no mundo. Estes recursos deveriam pagar os impostos, que permitiriam ampliar investimentos públicos, e deveriam ser aplicados em fomento da economia onde foram gerados.
Um segundo estudo particularmente interessante é doGlobal Financial Integrity,coordenado por Dev Kar,Brasil: fuga de capitais, fluxos ilícitos e as crises macro-econômicas, 1960-2012. Trata-se de uma sangria de recursos por evasão, estimada em 80 bilhões de reais por ano entre 2010 e 2012, (cerca de 1,5% do PIB). São recursos que por sua vez irão alimentar em boa parte o estoque de mais de um trilhão de reais em paraísos fiscais visto acima. Segundo o relatório, ” o governo deve fazer muito mais para combater tanto o subfaturamento de exportações como o superfaturamento de importações, adotando ativamente medidas dissuasivas adicionais em vez de punições retroativas.” Trata-se aqui, dominantemente, das empresas multinacionais. Kofi Annan considera que este mecanismo drena cerca de 38 bilhões de dólares por ano das economias africanas. O mecanismo é conhecido comomispricing,outrade misinvoicing.( GFI, 2014)
É importante antes de tudo entendermos os limites da atuação de um governo. No plano internacional, enquanto existir a tolerância de fato, por parte das elites americanas e europeias, dos paraísos fiscais, inclusive nos próprios EUA como é o caso do Estado de Delaware, e na Europa como é o caso de Luxemburgo e da Suíça, dificilmente haverá qualquer possibilidade de controle real. A evasão fiscal torna-se demasiado simples, e a possibilidade de localizar os capitais ilegais muito reduzida. A ordem pode, no entanto, ser bastante melhorada no controle das saídas, do sub e sobrefaturamento e semelhantes. O relatório da GFI, mencionado acima, aponta estas possibilidades e reconhece fortes avanços do Brasil nos últimos anos. No plano internacional, surge finalmente o BEPS(Base Erosion and Profit Shifting),endossado por 40 países que representam 90% do PIB mundial, início de redução do sistema planetário de evasão fiscal pelas empresas transnacionais. (OCDE, 2014)
No plano interno, as medidas não podem ser diretas. A ANEFAC deixa claras as limitações de um sistema que é formalmente regido pelo direito privado: “Destacamos que as taxas de juros são livres e as mesmas são estipuladas pela própria instituição financeira não existindo assim qualquer controle de preços ou tetos pelos valores cobrados. A única obrigatoriedade que a instituição financeira tem é informar ao cliente quais as taxas que lhe serão cobradas caso recorra a qualquer tipo de crédito.” Naturalmente, como se trata de um cartel, o tomador de crédito não tem opção. As recomendações da ANEFAC são muito simples: “Se possível adie suas compras para juntar o dinheiro e comprar o mesmo à vista evitando os juros.” Ou seja, não use o crédito. Isto recomendado pela Associação dos Executivas de Finanças, Administração e Contabilidade, é impressionante.
Mas o governo tem armas poderosas. A primeira é retomar a redução progressiva da taxa Selic, o que obrigaria os bancos a procurarem aplicações alternativas, voltando a irrigar iniciativas de empreendedores, e reduzindo o vazamento dos recursos públicos para os bancos. A segunda é de reduzir as taxas de juros ao tomador final na rede de bancos públicos, conforme foi experimentado em 2013, mas persistindo desta vez na dinâmica. É a melhor forma de introduzir mecanismos de mercado no sistema de intermediação financeira, contribuindo para fragilizar o cartel e obrigando-o a reduzir os juros estratosféricos: o tomador final voltaria a ter opções.
A terceira consiste no resgate de um mínimo de equilíbrio tributário: não se trata de aumentar os impostos, mas de racionalizar a sua incidência. A pesquisa do Inesc mostra que “a tributação sobre o patrimônio é quase irrelevante no Brasil, pois equivale a 1,31% do PIB, representando apenas 3,7% da arrecadação tributária de 2011. Em alguns países do capitalismo central, os impostos sobre o patrimônio representam mais de 10% da arrecadação tributária, como, por exemplo, Canadá (10%), Japão (10,3%), Coreia (11,8%), Grã‑Bretanha (11,9%) e EUA (12,15).” (Inesc, 2014, p.21) Se acrescentarmos a baixa incidência do imposto sobre a renda, e o fato dos impostos indiretos representarem 56% da arrecadação, temos no conjunto uma situação que clama por mudanças.
Fonte: Inesc – Implicações do sistema tributário brasileiro, set. 2014, (parte da Tab.1 p. 13)
“Convém destacar que a carga tributária é muito regressiva no Brasil, pois está
concentrada em tributos indiretos e cumulativos que oneram mais os/as trabalhadores/ as e os mais pobres, uma vez que mais da metade da arrecadação provém de tributos que incidem sobre bens e serviços, havendo baixa tributação sobre a renda e o patrimônio. Segundo informações extraídas da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) de 2008/2009 pelo Ipea, estima-se que 10% das famílias mais pobres do Brasil destinam 32% da renda disponível para o pagamento de tributos, enquanto 10% das famílias mais ricas gastam 21% da renda em tributos.” (Inesc, 2014, p.6)
A quarta consiste naturalmente em dinamizar um conjunto de pesquisas sobre os fluxos financeiros internos, de maneira a gerar uma transparência maior nesta área onde as pessoas simplesmente não se orientam. Para gerar a força política capaz de reduzir o grau de cartelização, reintroduzindo mecanismos de mercado e transformando o sistema de intermediação financeira, é preciso ter uma população informada. Um das coisas mais impressionantes para esta área vital para o desenvolvimento do país, é o profundo silêncio não só da mídia mas também da academia e dos institutos de pesquisa, sobre o processo escandaloso de deformação da economia pelo sistema financeiro.
Faça-se as contas da maneira que for: o fato é que a economia brasileira está sendo sangrada por intermediários que pouco ou nada produzem. Se somarmos as taxas de juros à pessoa física, o custo dos crediários, os juros à pessoa jurídica, o dreno através da dívida pública e a evasão fiscal por meio dos paraísos fiscais e das transferências ilícitas, temos uma deformação estrutural dos processos produtivos. Tentar dinamizar a economia enquanto arrastamos este entulho especulativo preso nos pés fica muito difícil. Há mais mazelas na nossa economia, mas aqui estamos falando de uma massa gigantesca de recursos, e que são necessários ao país. É tempo do próprio mundo empresarial – aquele que efetivamente produz riquezas – acordar para os desequilíbrios, e colocar as responsabilidades onde realmente estão. O resgate organizado do uso produtivo dos nossos recursos é essencial.
[1]Último artigo de Celso Furtado, no JB de 14 de novembro de 2004 –http://www.centrocelsofurtado.org.br/arquivos/image/201411191728100.Dossier%20CF%2020%20nov%202014%20ArtigoJBNovembro2004.pdf
ANEFAC, Relatório sobre juros, tabelas das páginas 2, 3 e 5http://www.anefac.com.br/uploads/arquivos/2014715153114381.pdf;
Banco Central –Histórico da taxa de juros – Selic –http://www.bcb.gov.br/?COPOMJUROS,2014
BIS Quarterly Review, June 2013, p.3 –http://www.bis.org/publ/qtrpdf/r_qt1306.pdf
DCI –Metade do consumo é financiada por cartões– 20 de agosto de 2014, p. B1
Dowbor, Ladislau –Os Estranhos Caminhos do Nosso Dinheiro,Editora Fundação Perseu Abramo, São Paulo, 2014,http://dowbor.org/blog/wp-content/uploads/2012/06/13-Descaminhos-do-dinheiro-p%C3%BAblico-16-julho.doc
Economist, Dec. 7th2013 – The rise of Black Rock,http://www.economist.com/news/leaders/21591174-25-years-blackrock-has-become-worlds-biggest-investor-its-dominance-problem
Economist,FEB. 16th2013 – The missing $20 trillion,Special Report on Offshore Finance
Furtado, Celso –Para onde caminhamos?– artigo publicado no JB de 14 de nov. de 2004http://www.centrocelsofurtado.org.br/arquivos/image/201411191728100.Dossier%20CF%2020%20nov%202014%20ArtigoJBNovembro2004.pdf
GFI –Brasil: fuga de capitais– Global Financial Integrity, Set. 2014 –http://www.gfintegrity.org/wp-content/uploads/2014/09/Brasil-Fuga-de-Capitais-os-Fluxos-Il%C3%ADcitos-e-as-Crises-Macroecon%C3%B4micas-1960-2012.pdf;
Henry, James – Tax Justice Network,The Price of off-shore revisited–http://www.taxjustice.net/cms/front_content.php?idcat=148; Os dados sobre o Brasil estão no Appendix III, (1) p. 23http://www.taxjustice.net/cms/upload/pdf/Appendix%203%20-%202012%20Price%20of%20Offshore%20pt%201%20-%20pp%201-59.pdfVer também no site da TJN a atualização de junho 2014,http://www.taxjustice.net/wp-content/uploads/2014/06/The-Price-of-Offshore-Revisited-notes-2014.pdf
ICIJ –International Consortium of Investigative Journalists, 2013-www.icij.org/offshore/how-icijs-project-team-analyzed-offshore-files
ICIJ– Luxemburg Tax Files– November 21014 –http://www.theguardian.com/business/2014/nov/05/-sp-luxembourg-tax-files-tax-avoidance-industrial-scale(para os dados em português referentes ao Itaú e Bradesco, ver artigo de Fernando Rodrigues, Folha de São Paulo 5 de nov. 2014http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/11/1543572-itau-e-bradesco-economizam-r-200-mi-em-impostos-com-operacoes-em-luxemburgo.shtml)
INESC – As implicações do sistema tributário brasileiro na desigualdade de renda – setembro de 2014,http://www.inesc.org.br/biblioteca/textos/as-implicacoes-do-sistema-tributario-nas-desigualdades-de-renda/publicacao/
IPEA –Transformações na indústria bancária brasileira e o cenário de crise –Comunicado da Presidência, Abril de 2009,p. 15http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/pdf/09_04_07_ComunicaPresi_20_Bancos.pdf
OCDE – ICIJ –BEPS: Base Erosion and Profit Shifting–http://publicintegrity.us4.list-manage1.com/track/click?u=8dc6eceed67f7f012462d0b12&id=f388dc1436&e=d256201ac5
Schneyer, Joshua –Commodity Traders: the Trillion Dollars Club –http://dowbor.org/2013/09/joshua-schneyer-corrected-commodity-traders-the-trillion-dollar-club-setembro-201319p.html/ouwww.reuters.com/assets/print?aid=USTRE79R4S320111028
Vitali, S., J.B Glattfelder and S. Battiston – ETH,The Network, of Global Corporate Control.http://arxiv.org/pdf/1107.5728.pdf;
A versão online do presente artigo está emhttp://dowbor.org/2014/09/ladislau-dowbor-o-sistema-financeiro-atual-trava-o-desenvolvimento-economico-do-pais-setembro-2014-11p.html/
Contato:[email protected]; Blog:http://dowbor.org