Dentro de cada ser humano habita um universo invisível, povoado por entidades silenciosas que moldam destinos: nossos pensamentos. Esses seres intangíveis, tão próximos quanto desconhecidos, travam uma guerra perpétua entre luz e sombra, definindo a dualidade que nos constitui. São eles que sussurram compaixão em um ouvido e alimentam a inveja no outro, enquanto navegamos entre o desejo de elevar uns e a tentação de destruir outros. Essa batalha interna, ancestral e universal, é a essência da condição humana — um conflito onde não há vencedores definitivos, apenas escolhas efêmeras que desenham quem somos.
Nossos pensamentos, arquitetos das emoções, não se limitam a observar; eles agem. Um ideal generoso pode erguer pontes, assim como uma lembrança amarga envenena a alma. Libertos de rédeas, esses seres alternam entre a criação e a destruição: um devaneio de gratidão aquece o coração, enquanto uma ruminação de ódio corrói a paz. Paradoxalmente, é essa mesma liberdade que nos torna reféns. Sem perceber, entregamos o controle a narrativas mentais que nos escravizam — repetimos padrões, cultivamos medos e, muitas vezes, confundimos a voz dos pensamentos com a nossa própria identidade.
Ignorar essa dinâmica interna é mergulhar em uma ilusão perigosa: projetamos nos outros a responsabilidade por nossas quedas. Quando a frustração ou o ressentimento nos dominam, culpamos o mundo exterior, como se fossem alheios os germes que brotaram em nossa mente. Essa cegueira alimenta ciclos de autossabotagem, pois não reconhecemos que a semente do fracasso, assim como a do sucesso, foi plantada e regada em nosso solo interior. A incapacidade de enxergar essa verdade nos torna estranhos de nós mesmos, eternos fugitivos de nossa própria sombra.
Reverter esse jogo exige mais que autoconhecimento — demanda coragem para encarar os senhores que habitam nossa mente. Observar os pensamentos sem se identificar com eles é o primeiro passo para desarmar a guerra interna. Quando compreendemos que somos o céu, e não as nuvens passageiras, recuperamos o poder de escolher quais vozes alimentar. Dominar essa arte não elimina a dualidade, mas transforma o caos em dança: cada passo, consciente, aproxima-nos da liberdade de ser, enfim, donos de nossa própria história.
Por Demerval Siqueira