Rimos deste termo arrancado não sei de qual departamento de minha mente e daí por diante usamos esta palavra para tudo, por exemplo, eu contando de minha cozinha que ficou pronta e que no momento não posso ter nenhum gasto porque estou depauperada financeiramente. Enfim, a partir daí passamos a usar o “depauperado” para designar qualquer coisa. Mas outros termos e expressões vieram à baila. Uma delas tirou do fundo do baú a palavra “panca”, fulana tem panca, é pancuda, expressão usada nos anos 70 e lá vai pedrada. Quem não se lembra de chamar de “pão” um moço bonito? Rimos pra valer.
Depois em casa fiquei puxando por palavras e expressões usadas por minha mãe: “esta é de gloriosa”, significando algo inusitado. “Você me mude o nome se …”, querendo dizer que duvidava muito que tal coisa acontecesse. “fulano tava chaleirando cicrano”, isto é, puxando o saco. “Ela me passou um respe”, querendo dizer “me passou uma reprimenda.” E por aí fui mergulhando no precioso dicionário de expressões que herdamos de minha mãe e me deliciando com as lembranças. Meu pai já costumava usar o adjetivo “superior” para tudo que fosse ótimo, como: “o sorvete está superior”, e muitas vezes ele dizia que “no início tudo são flores”, referindo-se ao casamento que se torna difícil com o tempo.
Tenho paixão pelos ditados populares. Meus preferidos entre milhares de outros que gosto: “fechar em copas”, “enfiar a viola no saco”, “não falar em corda na casa de enforcado”, chamar às falas”, “favas contadas”. Nossa! São tantos e ótimos!
Também gosto muitíssimo das frases de São Paulo: “A figura deste mundo passa”, “não se ponha o sol sobre sua ira”, “tudo posso, mas nem tudo me convém”, “não faço o bem que quero, mas o mal que não quero”, e outras que vivo falando e escrevendo.
Cada família, cada turma de amigos e cada comunidade de cada época tem suas expressões e seus códigos, e essas expressões e códigos vão cedendo o lugar para outros novos. Novos termos e códigos já esperam ansiosos na fila para serem usados pelas crianças e jovens de hoje, e tenho que confessar que muitos eu nem conheço. Já li que a vida eterna não existe, que o que existe mesmo são as pessoas eternizadas pelo que diziam e como diziam, pelas expressões que usavam. Minha mãe e meu pai são lembrados por nós pelas suas falas. É fato (mas eu acredito na vida eterna).
A linguagem e a linguística com essa pluralidade de códigos me impressionam, me espantam e me causam um contentamento indescritível. Adoro Roland Barthes, linguista e filósofo que afirmava que “o prazer da linguagem jamais foi seriamente estimado”. Barthes dá um exemplo sobre a linguística que se ocupa com as mensagens: três tabuletas em três casas, cada uma com uma expressão e uma só mensagem – “cão bravo”, “cão perigoso” e “cão de guarda”. Na verdade a mensagem é apenas uma: “Não entrem”. Porém nada é inocente. Certamente cada placa tem algo a ver com o proprietário. Barthes enfatiza que “a linguagem não é mero instrumento do homem; é ela que constitui o homem.” Show, né gente? Eu acho.