Há muito tempo, fui aplicar o vestibular da UNIFEI em Campinas e, ao sairmos do apartamento da minha filha para a viagem de volta, aconteceu um fato que só saberíamos no dia seguinte, em Itajubá. Minha esposa e filhos ficaram desesperados, mas, para aumentar o suspense, primeiro vou contar esta história:
Um carpinteiro americano construiu algumas caixas para a sua igreja enviar doações a um orfanato da China. À noite, colocou a mão no bolso da camisa para pegar os óculos, mas eles tinham sumido! Procurou por todo lado e concluiu o que acontecera: tinham deslizado para fora do bolso e, sem que notasse, caído num dos engradados que ele havia fechado com pregos.
Portanto, seus óculos novos estavam rumo à China! Ele ficou muito chateado com a ideia de ter que comprar outro e comentou com a família: ‘Não é justo! Eu tenho sido muito fiel a Deus dando meu tempo e dinheiro para a Sua obra, e agora isto!’
Vários meses depois, um missionário estava de passagem pelos Estados Unidos quis visitar as igrejas que o apoiaram na China. Numa delas, ele começou agradecendo as pessoas, assim: ‘Primeiro, eu tenho que lhes ser grato pelos óculos que me enviaram no ano passado. Vejam, os comunistas tinham passado pelo orfanato e destruído tudo, inclusive meus óculos! Eu estava desesperado e, até mesmo se eu tivesse dinheiro, simplesmente não havia como substituir aqueles óculos. E tive enxaquecas diariamente até que seus engradados chegaram. Quando meu pessoal removeu as tampas, acharam os óculos colocados por cima de tudo!’
Então, ainda emocionado com a maravilha do ocorrido, continuou: ‘Irmãos, assim que experimentei os óculos, percebi que eram como se tivessem sido feitos sob encomenda para mim! Eu quero lhes agradecer de coração por tamanha caridade. Louvado seja Deus!’
Muita gente não entendeu aquelas palavras porque não havia óculos na lista de material enviado à China, mas, em silêncio no fundo da igreja e com lágrimas escorrendo pela face, um simples carpinteiro percebeu que o Mestre lhe tinha usado de um modo extraordinário.
Bem, voltando ao fato de Campinas, quando estávamos arrumando as malas, minha esposa colocou todas as roupas sujas num grande saco preto de lixo, incluindo também muitas peças novas da minha filha que mora lá, dizendo que traria para lavar. Ao entrarmos no elevador com toda aquela bagagem – sacolas de provas do vestibular, inclusive –, carregamos ainda o lixo do apartamento – também em sacos pretos!
Acho que já deu para imaginar que, na saída, as malas foram para o carro e os sacos pretos para o tambor de lixo. Voltamos rezando o terço e agradecendo porque tudo correu muito bem, como sempre, até que no dia seguinte demos falta nas roupas sujas e começou o falatório: ‘Minhas toalhas novas! Minha bermuda que eu mais gostava! O tênis estava novinho! Lá se foram as melhores roupas da Thaís ir trabalhar, coitada! Quanto prejuízo!’
Realmente, o prejuízo financeiro foi grande, mas eu disse a todos: ‘Gente, pensem na alegria de quem achar aquilo tudo! Nós nunca faríamos conscientemente tamanha caridade, concordam?’ Naquele momento, estas palavras pouco adiantaram porque um estava mais chateado do que o outro e procurando o culpado em ter deixado o engano acontecer, porém, no outro dia, eu recebi pela internet a história do carpinteiro que contei.
Simples coincidência ou um sinal confirmando que alguém que muito precisava havia achado as nossas roupas novas? Logicamente, quem as achou é muito pobre, porque, caso contrário, não mexeria em lixo. Mas, mesmo assim, me perguntaram: ‘E se ninguém achou e está tudo ensacado até hoje?’ Só respondi que esse pensamento não traria nada de volta.
Hoje, até damos algumas risadas quando lembramos. Seria exigir demais do Céu pedir que um dia alguém aparecesse vestido com os nossos trajes perdidos para termos certeza que valeu a pena a ‘partilha’. Eu nunca pediria isso, mesmo porque tenho convicção de que o fato só aconteceu por um dos dois motivos: vestir melhor alguns necessitados ou nos desapegarmos um pouco mais dos valores materiais.
Caso tenha acontecido a primeira opção, fico contente pensando que houve pobres vestidos com roupas de qualidade, gozando do fruto do nosso trabalho. Se foi uma lição que recebemos por não doarmos o que temos de melhor a quem precisa, foi muito justa a partilha. E se as duas coisas aconteceram, peço a Deus que todos os envolvidos melhorem de vida – material e espiritualmente.
Agradeço também porque não ficamos pobres com o ‘prejuízo’, apenas houve algum espaço a mais sobrando no guarda-roupa. Até isso foi muito bom!