Fui à manicure e enquanto conversávamos, falamos sobre desaparecimentos de pessoas e eu fui contar pra ela dos “Sobreviventes” dos Andes, lá pelos idos de 70. Em determinado momento eu me emocionei quando falei dos dois rapazes que haviam conseguido descer a montanha para buscar ajuda depois de três meses. Esfarrapados, com pouquíssimo peso, eles avistaram dois cavaleiros do outro lado de um riacho e gritaram por socorro, contando que eram do avião acidentado. Neste momento eu parei porque não conseguia mais falar. A manicure e eu derramamos lágrimas. Como é estranho e belo o engenho das lágrimas que vêm em socorro de nossas emoções lavando nossos olhos e nossas almas!
Então, no documentário a que assisti, um dos sobreviventes de nome Fernando falava sobre o impacto de tal acontecimento em sua vida. E ele disse: “nós estávamos condenados à morte, haviam desistido de nos procurar”. Foi um verdadeiro milagre terem conseguido se salvar depois de muito sofrimento. O próprio Fernando teve a irmã ferida em seus braços por vários dias até que ela morreu, e a mãe já havia morrido na queda do avião. Eles não tinham nada, apenas escombros, neve, frio, fome e desesperança porque depois de certo tempo compreenderam que não viriam mais em sua busca. Num gesto extremo, dois deles, os menos fracos fisicamente, despediram-se dos outros e desceram os Andes sem qualquer preparo. Era a última cartada. Fernando comentou que qualquer pessoa com qualquer problema na vida pode encontrar uma saída. Eles não tinham saída. É fato que muitos estão condenados à morte por doença grave, na verdade todos estamos condenados à morte. Mas enquanto há vida, realmente há esperança.
E enquanto estamos vivos, temos que procurar viver da melhor maneira possível, sabendo que a vida oferece infinitas possibilidades. Falo isto pra quem quiser ouvir e na verdade, falo pra mim. Porque sou pessimista, dramática e qualquer coisa pra mim vira um bicho de 777 cabeças. Se sou feliz, sou sempre boa, mas quando sou boa, nem sempre sou feliz, como dizia Oscar Wilde. Sou alegre até que aconteça uma coisinha de nada. Aí perco o sono e o humor. Recupero logo, mas fico abatida. E eu queria ser mais otimista, mais forte. Achei m a r a v i l h o s o o que minha amiga Laís disse sobre a frase de Maria Lyra Pereira, já falecida. Ela foi uma poetiza de grande sensibilidade que veio morar e fazer poemas em Itajubá: “O por do sol não é triste … é cor de rosa”. Pois é, eu queria aprender a enxergar cores e flores em meio às dores. Sempre depende de como vemos as coisas.
Bem, mas por que o título “pobrete, mas alegrete”? você deve estar se perguntando. Porque no meio disso tudo lembrei-me de um fato relatado pela minha querida D.Cora. Em seu programa de televisão, Hebe Camargo contou que sua família era muito pobre. Quando ela e seus outros irmãos topavam com alguma comida tipo arroz com ovo, às vezes apenas pão, algo sempre simples, fechavam a cara. Mas sua mãe, uma mulher eminentemente maravilhosa, arrumava a mesa com todo o carinho, como se fosse servir uma comida para reis e rainhas. Ao perceber o desagrado das crianças, ela dizia com uma gentil autoridade: “Nada de chororô, sorriso nos lábios de todo mundo. Pobrete, mas alegrete”, insistindo com muito orgulho no lema que criou. Achei lindo!
Mesmo ciente dos horrores da humanidade com tantos sofrimentos e misérias incompreensíveis, não posso deixar de me emocionar com tanta beleza que a vida nos oferece a cada segundo: o mistério das lágrimas que surgem de uma secreta fonte subterrânea, a lua que aparece no céu escuro, frases filosóficas, poemas sensíveis que gostaria de ter escrito, mães que cuidam para que seus filhos sejam felizes, a esperança dos que estão condenados. Mesmo sendo tão contraditória e fugaz, a vida continua sendo esplendidamente bela e intensa.
Alegremos e exultemos!