No decorrer do exercício profissional, vamos nos apropriando de alguns termos sem ,efetivamente refletirmos a respeito de seus significados e de seus desdobramentos. Termos como cidadania, ética e responsabilidade social estão entre os muitos que usamos. E o exercício de tomar distância para a elaboração de uma reflexão nos obriga a redimensionar não apenas os próprios significados de tais termos, como principalmente, nos propicia uma incursão crítica quanto ás decisões que tomamos, quanto ás lentes que assumimos na lida cotidiana para a compreensão do mundo que nos cerca.
A “gastura” das palavras, com o tempo, vai de tal forma, tornando-as familiares tais como as paisagens que percorremos todos os dias que perdem a cor e o viço de nosso olhar. Assim, ao empreender essa tarefa de elucidação solicitada por alunos, sinto que o melhor de nós, professores, está no que os alunos de nós exigem. E é com esperança que inicio essa possibilidade de refazer meu olhar, ampliar as janelas que me contatam com o mundo e que me atraem para uma resignificação deste espaço de ação e de convivência, de ser e de estar presente e atuante nestas paisagens.
Não sei se serei capaz de trazer uma nova visão nem novas possibilidades. Porém, caminharei no sentido de reelaborar o percurso da possibilidade de mobilizar, de apontar exemplos, de resgatar alguma esperança. Porque pensar o mundo só terá sentido se pensar um mundo melhor em que todos possam fazer deste mundo, um mundo para todos.E a esperança já está alinhavada aqui por este espaço que está sendo proporcionado por estes jovens universitários.
que significa o termo que tanto temos ouvido e que é tema desta palestra?Responsabilidade – Obrigação geral de responder pelas conseqüências dos próprios atos ou pelas dos outros.Ampliando, poderíamos deduzir que Responsabilidade Social refere-se á relação de obrigação em responder pelos meus atos em âmbito social. Mas, não cabe aqui nos reduzirmos a uma definição restrita.A quê efetivamente o termo Responsabilidade Social nos reporta?
Ao refletirmos sobre o termo, algumas questões devem ser colocadas, tais como: O que é ter responsabilidade social?A quem cabe? Como surgiu?É resultante de um processo histórico?
Há anos o Planeta Terra é caracterizado por um lugar onde a desigualdade e a concentração de riquezas aumentam a cada dia.
Se em 1970, 70% da riqueza era detida pelos 20% mais ricos, em 1998, este valor subiu para 84%, enquanto em 1960, 2,3% dos recursos eram dos 20% mais pobres e em 1998 passou a ser 1,4% (ONU:1998). Outros graves problemas sociais como trabalho infantil, alto índice de mortalidade das crianças com menos de cinco anos de idade, preocupam aqueles dispostos a fazer alguma coisa pelos marginalizados e exigem posturas arrojadas da universidade e das instituições sociais.
A exclusão é muito mais grave que a marginalização. Os marginalizados estão dentro do sistema, à margem. Confrontam-se com o subdesenvolvimento e buscam o desenvolvimento através da integração ao sistema. Os excluídos estão fora. São considerados zeros econômicos. Não existem. Estes confrontam-se diretamente com a morte. E morrem antes do tempo.
Essa “não solidariedade” entristece, desilude a quem sonha em um dia viver em um mundo melhor. A solução para este mundo melhor seria “evocar a com-paixão como um realidade relevante e urgente” (Boff,2001,p.9). Esta com-paixão não servirá de auxílio única e exclusivamente aos mais pobres. Terá também uma função importantíssima de amparo à natureza. Boff diz que o equilíbrio físico-químico da Terra, construído sutilmente durante milhões e milhões de anos, pode romper-se devido à irresponsabilidade humana.Não somente os pobres que gritam, grita também a Terra sob o esgotamento sistemático de seus recursos não renováveis e sob a contaminação do ar, do solo e da água. Esta situação provoca a com-paixão com nosso lar comum, a Terra…A com-paixão como um dos valores fundamentais, capazes de enriquecer o novo paradigma e fundar uma aliança de perene paz com a Terra.
Segundo Boff(2001), com-paixão é mais do que um ato ou conjunto de atos de profunda humanidade em direção ao outro. É uma atitude fundamental, como tal geradora de atos compassivos. Mesmo a pessoa mais brutal e mais anticomunitária, diz-nos Adam Smith, não está imune à com-paixão. Isto nos leva a pensar que a com-paixão é algo essencial na linha de um princípio em sentido filosófico, que está presente e atuante. Todo princípio tem que ver com a essência ou da natureza da pessoa humana, de seu modo de ser concreto. Então podemos dizer que o ser humano é essencialmente um ser-de-com-paixão. Isto se deriva da reflexão contemporânea, seja consciência dos limites da racionalidade que imperou nos últimos séculos no Ocidente.”
Daí se conclui que o dado original não é o logos, a razão e as estruturas de compreensão, mas sim o pathos, o sentimento, a capacidade de simpatia, de empatia, de com-paixão, de dedicação e de cuidado com o diferente. Tudo começa com o pathos (sentimento). É ele que nos faz sensíveis e re-ativos a tudo quanto nos envolve. É por ele que sofremos e nos alegramos com os que se alegram e sofrem, que nasce em nós a com-paixão. É por meio dele que acolhemos ou repelimos as pessoas.
“Com-paixão”,como sugere a filologia da palavra, é a capacidade de com-partilhar a própria paixão com a paixão do outro. Trata-se de criar mecanismos nas instituições para um sair de si mesma e de seu próprio círculo e entrar no universo do outro enquanto outro-comunidade, para ” (…)sofrer com ela, para cuidar dela, para alegrar-se com ela e caminhar junto a ela, e para construir uma vida em sinergia e solidariedade” (Boff,2001,p.15)
Interessante a análise de Paoli (2002) sobre o atual movimento brasileiro em torno da “Responsabilidade Social” (das empresas), acobertando a tática de ocultação das políticas que aprofundam a marginalização social, enquanto confunde a sociedade brasileira e ocupa espaços públicos agora privatizados. Sem desconhecer que muitas críticas ao Estado são adequadas, até porque o Estado é, em grande parte, espólio privado, o risco está em ocultar que a origem principal da marginalização das maiorias se apresenta como redentora, em abusivo efeito de poder.
As causas de toda a violência na vida humana
Riqueza sem trabalho
Prazer sem consciência
Conhecimento sem caráter
Comércio sem moralidade
Ciência sem humanidade
Adoração sem sacrifício
Política sem princípios
Direito sem responsabilidade (Gandhi)