Foi, sem dúvidas, a principal tese jurídica dos últimos tempos dentro do cenário previdenciário, denominada doutrinariamente como Revisão da Vida Toda (RVT) ou também conhecida como revisão de toda a vida contributiva, oriunda da prática judicial de especializados escritórios de advocacia.
Ganhou então um formato jurídico e a atenção da mídia, além dos olhares esperançosos de uma boa parte de aposentados brasileiros, sedentos por melhorias financeiras de seus benefícios, notadamente pelo conhecido fato de que a corrosão econômica e a frágil política de reajustes inserem este específico público-alvo distante dos arquitetados primados constitucionais do bem-estar, da justiça social e da dignidade humana.
Percorreu diversos órgãos do Judiciário Nacional, em todos os níveis e graus de jurisdição, até que no cenário da Suprema Corte ganhou olhares do Tribunal Maior do País.
No STF foi alocada em temática de repercussão geral, dentro do tema 1.012, ou seja, inserida em um sistema de crucial vitalidade jurídica para a sociedade brasileira, em outras palavras, uma tese de gigante repercussão social, jurídica, econômica e política.
A bem da verdade uma tese revisional e portanto, enraizada em vários requisitos de contemplação. Também, um pensamento jurídico coeso, sólido e viável, pois em sintonia ao princípio-mor da existência do prévio custeio como forma de financiamento seguro do sistema. E, de igual forma, uma tese de exceção, ou seja, contempladora de poucos beneficiários do sistema, tendo em vista a existência de vários filtros, dentre esses o prazo decadencial decenal; não incidência nos benefícios assistenciais e nem daqueles do sistema rural; a necessidade de prévio cálculo, dentre outros.
Portanto, demonstrada a viabilidade jurídica de sua essência, contudo, mal compreendida e rechaçada no derradeiro pronunciamento colegiado do Tribunal Maior.
A vitalidade da tese compreendia duas concepções básicas, ou seja, existência de contribuições pretéritas vantajosas dos beneficiários com capacidade de incremento positivo no sistema de cálculo de sua renda mensal inicial, bem como, quanto a correta interpretação das ulteriores novidades legislativas.
É que a Lei 9.876/1999 pelo artigo 3º imprimiu no sistema de cálculos das prestações previdenciárias do RGPS substanciais novidades, criando uma regra definitiva e uma regra de transição, atingindo de forma uníssona tudo e todos, ou seja, mesmo àqueles que já estavam integrados no sistema previdenciário de forma antecedente.
Assim restou criado um legal sistema de exclusão; desigualdade e de retrocessos, já que a nova regra premiou no sistema de cálculo o cômputo de todas as contribuições vertidas, ao passo que para quem já se via inserido de forma antecedente, a única opção ao modelo transicional, vale dizer, o cômputo das contribuições vertidas a partir de julho de 1994.
Aqui, o debate central e jurídico da tese, isto é, compreender axiologicamente o sentido das novidades normativas e alocar seus beneficiários a um modelo de melhor proteção previdenciária, algo que a Suprema Corte preferiu se distanciar.
Entendeu a Casa Maior da Justiça Brasileira que a RVT não detém objetiva norma autorizadora, além de que a mudança normativa controvertida detém cogente e público teor, com olhares ao sistema como um todo, sem a possibilidade de individualizar o interesse particular de cada participante, algo exclusivo dos regimes de capitalização, mas não da Previdência Pública.
Verdade que mesmo na Suprema Corte a tese teve idas e vindas, tanto de plenário físico como no virtual, debatida que foi através de vários recursos, amigos da Corte e ainda com a habitual mudança da composição dos Eminentes Ministros Julgadores.
Em recente e derradeiro julgamento ocorrido em 10 de abril de 2025, ocorreu um novo suspiro da tese, unicamente para aplicar efeitos modulatórios, sem modificar o mérito aferido anteriormente de denegação da essência.
A partir de então, o desfecho da tese pelo Tribunal Maior e que irá provocar uma verticalização do seu entendimento pelos demais Tribunais do País, a ponto de promover a extinção de milhares de processos que a perseguiam em juízo.
Entendeu o STF pelo seu fim, imprimindo interpretação estritamente legalista e restritiva, com distanciamento jurídico de outras variantes que permeiam o núcleo das relações jurídicas previdenciárias, aliás, de conhecidos patamares constitucionais de existência e vitalidade.
Inobstante a existência de prévio custeio e por ser uma tese jurídica excepcionalíssima, a limitação proclamada pelo julgamento implicou em retrocessos, preterindo a aguardada oportunidade de aprimoramento e evolução do sistema previdenciário, em outras palavras, viabilizou a arrecadação sem a contrapartida protetiva.
Em triste fim, o STF proclamou o encerramento da justa busca de aposentados por tratamento jurídico que espelhasse as diretrizes constitucionais, notadamente àquelas protetivas; do bem-estar e da justiça social, sonhos esses que ainda precisam ser sonhados.
Sérgio Henrique Salvador
Doutorando em Direitos Humanos pela PUC/SP. Mestre em Direito Constitucional pela FDSM. Pós-Graduado em Direito Previdenciário pela EPD/SP. Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Professor Universitário. Escritor. Pesquisador. Advogado. Ex-integrante do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) Regional da OAB/MG. Membro da Rede Internacional de Excelência Jurídica. Integrou a comitiva de professores brasileiros no “I Congresso Internacional de Seguridade Social” da Faculdade de Direito de HARVARD (EUA) em agosto/2019.