Estranho que eu escreva sobre suicídio quando o mês dedicado à atenção a ele já passou? Na verdade, acho que não.
Morte por suicídio é sempre um evento extremamente traumático para a família, os amigos, para toda a sociedade.
Todo mundo tem algo a dizer sobre como identificar um possível suicida, como ampará-lo, como ajuda-lo a retomar a vida…
Mas hoje não é esse o meu foco.
Hoje eu quero conversar com os “sobreviventes”, que é como tem sido chamados os familiares, os amigos, ou seja, as pessoas que ficam vivas, mas profundamente impactadas pela morte súbita do suicida.
Para começo de conversa, para o suicídio não existe uma causa única. Todo ato suicida responde a milhares de sentimentos de frustração, de menos valia, de tristeza profunda, de falta de objetivo de vida, de desesperança… Às vezes, é na infância que se desenha uma personalidade predisposta ao suicídio, se e quando despontar um momento de crise profunda numa fase de fragilidade.
Portanto, aqui vai uma “instrução” aos sobreviventes:
Não se amargurem buscando causas para o suicídio. Especialmente, não se desesperem pensando que “se eu tivesse feito, ou dito, ou escrito, ou abraçado, ou ouvido…”, nada teria acontecido!
A dor da alma é absolutamente íntima e pessoal, difícil de ser medida, avaliada ou, às vezes, até mesmo, aliviada.
Como familiar ou como profissional, eu posso fazer o meu melhor ouvindo, confortando, consolando, estimulando, mas só e apenas isso. Eu não tenho poder para convencer alguém que sofre profundamente, que a vida é melhor do que a morte.
Na minha profissão eu já ouvi sobre uma quantidade tão grande de dores, que às vezes chego a pensar que já conheço todas. Mas ouvir, mesmo que como o coração e a alma plenos de compaixão, não me ensinou a avaliar nem a julgar a intensidade delas.
Ouvi sobre dores que me custam até mesmo lembrar, e os donos delas levam até hoje uma vida plena para eles mesmos.
Ouvi sobre dores que nem são dores profundas pra muita gente, e os donos delas escolheram ir embora, em busca de alívio.
Estive por muito tempo com pessoas que, por várias vezes quase partiram, e que hoje dizem que são muito felizes. Estão salvas? Não sei…
Então, o que me resta, como amiga, como familiar ou como profissional que acompanha qualquer pessoa pela vida? Ama-la muito sempre que possível, estar ao lado, aceita-la nas suas diferenças, apoia-la nas suas decisões e desejar-lhe a melhor e mais longa vida que seja possível.
E se ela precisar partir antes do tempo que lhe coube, rezar pela sua paz.
Por Graça Mota Figueiredo
Professora Adjunta de Tanatologia e Cuidados Paliativos
Faculdade de Medicina de Itajubá – MG