Além dos vinhedos, em especial da região demarcada do vinho do Porto, onde a paisagem é única com as suas imensas encostas e quintas, produz culturas como o centeio, a batata e a oliveira.
Seus pratos típicos são marcantes, entre eles o pão, o bacalhau, as alheiras, o porco, as carnes de caça, o cabrito e a conhecida posta mirandesa, raça do gado regional. Peixes de rio, grelos (couve), feijão, cogumelos, castanhas, queijos dos mais diversos e doces inumeráveis complementam sua riqueza e diversidade.
O povo é extremamente acolhedor e pelo que pude perceber, tem a emigração como uma característica secular e não há quem não tenha parentes no Brasil.
Cheguei logo após o Natal, dando continuidade à minha busca pelo conhecimento sensorial dos extra virgens de qualidade e a esta altura, enebriado por tantos aromas e sabores, acolhido com muito carinho, sinto ter escolhido este percurso em um passado sem início.
São vários os símbolos que me fazem concluir tal pensamento, pois muito mais do que o idioma em comum, da espiritualidade e de hábitos sutis, há algo de lúdico e poético na alma lusitana que nos une em uma humanidade insondável e incomparável para muito além de um simples “país colonizador”.
Francisco e António Pavão são os personagens que me receberam. Pertencem à famílias que se enraizaram nesta região há vários séculos e possuem a cultura do azeite no sangue… tenho às vezes a impressão que este fio de ouro corre em suas veias, tamanha a paixão com que falam do assunto e se dedicam ao cultivo e ao aprimoramento deste nobre produto.
António tem o dom comercial e cumpre suas funções com afinco. Francisco, engenheiro agrônomo e profundo estudioso é um dos azeitólogos mais respeitados de Portugal. Como grande conhecedor sensorial da diversidade dos azeites portugueses, trabalha incansável e apaixonadamente pelo aperfeiçoamento dos métodos de cultivo e extração, antenado com as pesquisas e os estudos que, entre os países produtores, tem otimizado a produção de qualidade.
Simão Aguiã Morant, pertencente à mesma família, de alma errante e trovadora, se dedica à divulgação dos nobres valores herdados desta rica cultura, vivendo atualmente entre o Brasil e sua terra natal, aqui se encontrando como anfitrião, me acolhendo com igual carinho e inigualável humor.
Verdeal, Negrinha do Freixo, Madural Trasmontana, Cobrançosa… essas são algumas das designações das principais variedades que dão origem aos excelentes extra virgens produzidos nesta região denominada Trás Os Montes e Alto Douro, onde a paisagem traz à alma uma poesia bela e melancólica, na qual os azeites parecem traduzir sua essência.
Francisco Pavão, assim como minha mestra Brígida Jimenez, de quem é amigo, conduz as análises sensoriais e ontem passamos toda a tarde degustando 19 azeites da campanha passada e os da nova safra.
De forma hábil e criteriosa expôs e descreveu a grande diversidade e riqueza dos extra virgens que se originam em terroirs extremamente próximos, cujo microclima diferenciado em poucos quilômetros proporciona características distintas e incomparáveis. Amargos e picantes, com complexidades e intensidades variadas, para cada azeite pensava um prato da culinária brasileira e o quanto ele pode enriquecê-la num casamento pefeito com a diversidade de nossas preparações. Estou cada vez mais convencido de que a mudança em curso na qualidade dos azeites que nos é oferecido é incondicional e influenciará diretamente a nossa própria produção ainda incipiente.
De minha viagem à Andaluzia a este passeio sensorial no nordeste português é auspicioso e revigorante perceber que há um caminho de qualidade sendo buscado entre os países produtores, caminho este que pode ter forte significado na reconstrução de valores tão caros à humanidade.
Como diz Carlo Petrini em seu livro “BOM, LIMPO E JUSTO”, o alimento, enquanto elemento cultural primário, deve ser a principal referência para o estudo da cultura e da identidade, a melhor representação de uma sociedade e o melhor meio para interpretar suas características.
Torna-se perceptível portanto, que os aromas e sabores transmitidos nas preparações culinárias são a expressão mais genuína da cultura de um povo e sua preservação é fundamental, não simplesmente para a manutenção de tradições, mas para que se possa resgatar às gerações futuras o elo com a natureza que nos nutre, afim de que a terra volte a ser um símbolo sagrado que sustenta a vida, onde também podemos encontrar os propósitos de nossa existência.
Que este despertar para a produção dos azeites genuínos, alimento ancestral, milenarmente extraído pelo homem seja o símbolo da reconstrução do mundo que findou em 2012.
Transcrevendo mais uma frase do escritor José Saramago: “NO INTERIOR DE CADA PAÍS ESTÁ O SEU DESTINO”… que a importância da origem do alimento genuíno possa dar a diretriz correta das novas relações sociais do mundo mais humano que queremos reconstruir.
VIVA TRÁS OS MONTES E O ALTO DOURO!
UM 2013 MUITO MAIS AZEITADO PARA TODOS NÓS!