Sendo uma escritora apaixonada pelas palavras (e me pergunto qual escritor não seria?) tropecei em uma palavra que sempre esteve aí desde que me entendo por gente, desde que leio, que estudo, e, no entanto, tenho a sensação de que só agora sou apresentada a ela: tributo. Fico maravilhada com este fenômeno que ocorre de tempos em tempos independentemente de minha vontade. Já aconteceu isso antes e sendo algo que eu nada possa fazer para que aconteça de novo, só me resta esperar pela grata surpresa de ser apresentada a palavras que já conhecia e que me aparecem com roupagem tão rica. É como se fossem rainhas disfarçadas em servas que tornam ao seu estado real e natural. Assim as palavras renascem para mim absurdamente belas e profundas.
Acima eu escolhi dizer “tropecei” para fazer um paralelo com o que diz o linguista russo Chklovski ao tentar definir o que é literário. Diz ele que é onde o “pé sente a pedra”. Você passa pelo mesmo caminho todos os dias e seu pé já se acostumou a todas as pedras, aí tem um dia em que você nota algo diferente, como se fosse uma pedra nova. É despertada uma emoção gostosa e estranha quando você lê algo que às vezes até já leu, porém dita de outra forma. Então, comigo e as palavras o fenômeno é quase igual. Pisei em cima do “tributo” e meu pé sentiu uma pedra diferente, e uma emoção gostosa e estranha tomou conta de mim.
Bem, vamos ao tributo. Recebi ontem de uma pessoa muito especial um livro muito especial, em que o autor oferece o livro que escreveu à sua amada esposa e companheira que não mais vivia. Assim ele escreve: “Um tributo a …” É claro que eu conheço os significados de tributo, entendi perfeitamente a homenagem que ele fazia à sua amada, porém eu nunca havia mergulhado em águas tão profundas de um significado, eu ficava apenas na rasante de uma homenagem e não percebia suas honrarias. Talvez pelo conteúdo do livro, pela maneira como dedicou o livro, a palavra tributo elevou-se diante de meus olhos a uma categoria máxima!. O fato é que às vezes as palavras se escondem, às vezes despertam e nos assaltam com tanta sensibilidade que eu me rendo.
Assim, fica aqui registrado meu tributo às todas as palavras e àquelas que se dignam vez ou outra a se mostrarem a mim em sua maneira mais bela, em sua roupagem real de tal sorte que eu me sinta feliz e honrada em conhecê-las. Não é preciso dizer que as palavras têm vida. Estendo também meu tributo à linguagem, ao discurso, a todos os significantes e significados. Quanta riqueza possui a linguagem! Só me resta perguntar se esta riqueza está nas palavras em si, no que significam ou dentro de mim quando amanheço em êxtase literário com a vida!
Aposentada, Misa descobriu o prazer da literatura e passou a escrever contos e crônicas. É formada em Letras pela FEPI Centro Universitário e pós-graduada em Literatura pela Unitau. Escreveu e publicou os livros: Demência, o resgate da ternura (autobiográfico) /Santas mentiras (Crônicas) /Dois anjos e uma menina (infantil) /Estranho espelho e outros contos, além da coluna “Verbo Inverso“.