Há certas coisas na vida que a gente tem que aceitar, a velhice é uma delas. Lá vou eu de novo aqui falando de velhice, não de velhice de alma, de espírito, não, isso não. Já conheci alguns jovens “velhos”, e por outro lado, muitos velhos “jovens”, pessoas genuinamente espirituosas que não necessitam de ficar fazendo piadas sobre a velhice para serem aceitos.
Quando a gente envelhece acontece um fenômeno interessante: você sabe que está velha ou idosa, porém, não se sente velha, poxa, sou eu, a mesma de sempre. Existe aí uma contradição, uma incongruência porque minha alma, meus sentimentos, pensamentos e ideias não confirmam a imagem do espelho. Mas o espelho e outras pessoas contradizem você, estão ali escancarados seu rosto e seu corpo. Não se iludam pelas fotos de anos atrás. Desistam de ficar namorando tais e tais e fotos. Quero deixar bem claro que as frases imperativas que aqui escrevo são para mim. Se, por um acaso, servirem para os leitores, que façam bom proveito.
É claro, of course, que estamos num tempo de tal avanço tecnológico em que se a mulher quiser e tiver muito dinheiro, poderá amenizar ou mesmo deletar os duros efeitos da velhice. Contudo, vaidosa que sou, tenho uma secreta e santa inveja (se é que a inveja pode ser santa) das atrizes americanas e algumas brasileiras também, que deixam tudo como está, não mexem em nada no rosto e corpo. Comparecem em cerimônias de premiação, todas bem vestidas, elegantemente, mas sem ter um único picotinho de botox em nenhum lugar. Assumiram a idade, que coisa bonita! Aí me lembro de minha mãe, tão lindíssima quanto modestíssima!
Depois que a velhice se instala como senhora absoluta, vai tudo ladeira abaixo, músculos, tendões, circulação ou “fiação interna”, como dizia Rachel de Queiroz, enfim, tudo envelhece. É verdade que exercitar-se e fortalecer músculos e ossos é questão de saúde, podemos e devemos. Tudo bem ficar velho! E quando é só velhice, beleza, pior quando é uma doença fatal, que fatalmente acontecerá, mais cedo ou mais tarde.
Há coisas que não mudam. Eu pensava assim: quando eu ficar velha não vou ficar falando “no meu tempo as coisas eram assim e assado”. Bobagem, eu falo, todo mundo que envelhece fala isso, que seja pouco, mas fala. Por mais que a gente não pare no tempo, que tente pensar e caminhar ao lado dos jovens, a gente sabe que nossos pensamentos e ideias são de nosso tempo, são produto do que vivemos, do que aprendemos. É da natureza humana.
Viver é perigoso, mas é tão belo!
Misa Ferreira é autora dos livros: Demência: o resgate da ternura, Santas Mentiras, Dois anjos e uma menina, Estranho espelho e outros contos, Asas por um dia e Na casa de minha avó. Graduada em Letras e pós graduada em Literatura. Premiada várias vezes em seus contos e crônicas.Embaixadora da Esperança (Ambassadors of Hope) com sede em Calcutá na India. A única escritora/embaixadora do Brasil a integrar o Projeto Wallowbooks. Desde 2009 Misa é articulista do Conexão Itajubá, enviando crônicas e poemas. Também contribui para o jornal “O Centenário” de Pedralva