Houve um tempo que existia uma fitinha vermelha que ao ser puxada rasgava a embalagem fazendo surgir uma tampa. Se você tivesse sorte, um biscoito poderia ficar ali preso, este é mais difícil de retirar, mas ainda sim bem mais fácil. Agora essas embalagens “modernas” só dificultam as coisas: é necessário certo esforço, que se não for bem aplicado pode desmanchar completamente a embalagem (Aí você corre o risco de perder uns três ou quatro), ou até mesmo deformar o plástico, deixando ainda mais difícil abri-lo. Talvez essas embalagens com as ditas fitinhas não estejam extintas, o fato é que comprei esse pacote na euforia. Estou faminto!
O sabor é de chocolate. A embalagem é marrom, evidentemente, e estampa o desenho de um animal usando fones de ouvido. Sempre achei isso estranho, quase sinistro na verdade. Algumas embalagens de carne de frango possuem o desenho de um galo sorridente e com trejeitos de Elvis Presley. Fico aqui imaginando com minha mente louca se as coisas fossem diferentes, se nós humanos é que fôssemos consumidos por frangos, como seria a embalagem? Certamente o desenho de um homem com penas, bico, e esporas ciscando num terreiro qualquer. Certamente. Mas no que eu estou pensando? Não se faz chocolate com esse animal. (Não se iluda ao achar que vou dizer qual animal é, se algum dia me tornar famoso este texto pode me impossibilitar de assinar um vantajoso contrato publicitário)
Mas é sério. Devo deixar estas divagações de lado como uma folha que navega pelas águas morosas de um rio que … desculpe! O fato é que estou com fome e finalmente obtive êxito em abrir esta maldita embalagem. Ah… o cheiro … Já vou sentindo o cheiro de açúcar e conservantes químicos possivelmente cancerígenos. Pego o primeiro e assim que o aproximo do nariz o seu cheiro forte invade meu sistema respiratório, começo a salivar imediatamente. Quando abro a boca sinto que um segundo a mais de demora me fará babar copiosamente. Eu o coloco com uma certa afobação e o sinto derreter aos poucos. Um arrepio de prazer corre pelo meu corpo e com minha língua vou massageando a massa adocicada. De repente toco o recheio. Outra onda de prazer, outro arrepio. Nessa parte o açúcar é mais adocicado e o gosto do chocolate intenso e pulsante. Em poucos segundos o biscoito some quase que completamente dentro da minha boca. Sobram alguns resquícios entre os dentes, que trato de limpar com a língua. O prazer durou pouco. Quero mais, quero desfrutar de todas as maneiras possíveis de se comer um biscoito (Pelo menos até que a embalagem não abrigue mais nenhum)
Dessa vez, opto por mastigar e assim o faço. Lentamente sentindo massa crocante de desfazer entre meus dentes. Ouso mais agora, imaginando que se colocar dois biscoitos na boca ao mesmo tempo obterei prazer em dobro. E assim o faço. Não mastigo e nem preciso realmente, minha saliva os abraça por completo os umedecendo, fazendo com que se unam num único bolo adocicado. Imagino que é um planeta e que o chocolate, certamente, seu núcleo. Sendo eu um monstro digno de Lovecraft ou um buraco negro pouco importa, o fato é que este também some em poucos segundos e o prazer foi um pouco maior, mas não chegou perto do que eu esperava. Agora como só a massa sem o recheio. Não acho graça. A embalagem diz, com suas letras pequenas e apertadas, que ali tem trigo, leite, soja, cevada, amendoim, ovo, centeio, avelãs, nozes etc. Nada é marcante. Arrependido, provo apenas o recheio. Adocicado de mais, forte demais. Não foi uma boa ideia. Retiro mais um do pacote. Como aproveitá-lo de forma memorável? Penso em como os ratos roem as coisas então o faço. A massa crocante se transforma quase em poeira dentro da minha boca à medida que vou roendo. Incrível! Repito isso mais duas vezes. Tenho mais uma ideia. Pego mais um e o perfuro com a língua molhada. Atinjo o recheio e todo o resto vai desarmando à medida que derrete. O resultado é que minha língua está doce. Passo-a pelo meu lábio e respiro aquele gosto. Restam apenas dois agora, como acabou rápido. Guardo a melhor ideia para o final. Coloco um biscoito em cada lado da minha boca como aqueles esquilos que provavelmente não existem no Brasil fazem, só que com nozes é claro. Os biscoitos derretem e espasmos correm pelo meu rosto e aumentam de intensidade a medida que o recheio vai se aproximando. Acabou. Coloco a embalagem no bolso e olho em volta. Preciso desesperadamente de água. Vou atrás de um copo gelado e refrescante.