Cá estou em minha salinha do computador ou meu escritorinho, como eu costumo chamar, minha toca. Acabei de fechar a janela porque a chuva intermitente engrossou e ameaça molhar meu computador. Se fosse no tempo antigo, algum escritor diria, “a chuva ameaça molhar meus papeis”. Há poucos dias meu marido ainda me dizia, não chove mais como antes. Pois a chuva escutou e veio. É quase verão, e mesmo mais fresquinho, sei que esta temperatura agradável logo vai esquentar, assim, vou abrir a janela, deixando este ar de chuva natalina entrar em minha salinha e minha alma.
Embora eu goste muito da chuva, como Rubem Braga, eu digo que a chuva me traz uma pontinha de tristeza. Acho bonita, bendita, sei que mais do que nunca a chuva é necessária, porém ela sempre chega com um quê de melancolia para me saudar. Hoje, especificamente, talvez seja porque o Natal se aproxima e como muitas outras pessoas eu também sinto um aperto dentro do peito. Penso que isso aconteça com pessoas mais velhas porque os velhos vivem mais de lembranças do que de sonhos. E esta chuvinha me lembrou um Natal antigo.
Não sei por que razão neste Natal de que falo, as coisas haviam melhorado financeiramente para meus pais. Pode ter sido por um premiozinho de loteria que meu pai tivesse ganhado. Eu me lembro perfeitamente de que ele sempre jogava na loteria e não é que por mais de uma vez ele ganhou alguma coisa? Nada que resolvesse os grandes problemas, mas sempre trazia um alívio, uma alegria, um prazer, como a cesta de Natal que já ficava garantida.
Então, minha mãe, toda animada, me chamou para “irmos às compras”, chique né? E debaixo de uma chuva fina, dessas típicas de Natal, percorremos várias lojas, esbarrando em pessoas também ávidas por comprar, e compramos presentes para todos nós e para os tios e primos. Nos demos ao luxo de presentear e para mim é verdadeira aquela máxima de que é mais gostoso presentear do que ser presenteado, é sim. Voltamos para casa carregadas de embrulhos, cansadas e molhadas de chuva, mas com os pacotes intactos que procuramos proteger a todo custo. Estávamos excitadas e alegres, dessas alegrias que o dinheiro pode temporariamente proporcionar.
Eu me lembro de que me encarreguei de colocar os nomes em cada pacote para que os presentes chegassem às mãos correspondentes. Deixamos tudo empilhado num quartinho dos fundos e de quando em quando eu ia lá para conferir e admirar nossas compras. Eu sempre soube a razão do Natal, é claro, eu já nasci com saudades de Deus, mas nunca consegui me libertar do desejo de ir às compras, sou feita de desejos fúteis e inúteis, sou a imperfeição das imperfeições e Deus me ama assim mesmo. Bendito seja Ele!
Mas eu falava da chuva, e voltando a ela, eu aqui, olhando a cortina que agora desce bem fininha, banhando a cidade, vou me lembrando de outros Natais chuvosos. Penso nas chuvas que já caíram sobre a Terra desde o início da humanidade. A chuva é um presente, é abençoada, afinal quando Deus criou nosso Paraíso terrestre, entre suas ideias e invenções maravilhosas, estava a água que vem do Céu para regar. E também agora com muito carinho me lembro de minha mãe que depois de ter presenteado a nós e a tantos outros, recebe agora o justo presente, o Natal real e verdadeiro. Junto com a toda a Corte Celeste, ela deve estar ajudando Nossa Senhora a preparar a Ceia na casa do Pai. Que luxo!