No artigo de hoje vamos analisar os dados do mercado de crédito e entender qual o impacto da COVID-19 no endividamento dos brasileiros e das suas empresas.
Desde o primeiro caso de COVID-19 confirmado pelo Ministério da Saúde no Brasil, no dia 26/02/2020, já são mais de 2 milhões de infectados (com cerca de 600 mil casos ativos) e, infelizmente, já registramos mais de 77.000 mortes pela doença. Estes números expressam que quase 13% das vítimas da doença em todo mundo são do nosso país, atrás apenas dos EUA. Somos o segundo país em maior número de mortes.
Neste cenário, o mundo inteiro volta toda a sua atenção para medidas de contenção de transmissão do vírus Sars-Cov-2, responsável pela doença COVID-19, por exemplo, tem-se registro de pelo menos 154 estudos que visam desenvolver a vacina para a doença ao redor do mundo. Até que este desenvolvimento não saia, o único instrumento até então adotado de maneira eficaz corresponde ao isolamento social.
Por sua vez, no Brasil, medidas não integradas e sinais trocados do governo federal acabam por limitar as ações que visam mitigar a transmissão da COVID-19 na população. Mesmo assim, seguimos, em maior parte, impulsionados a manter o isolamento social para resguardar nossas famílias e amigos.
Mas o isolamento social não resolve todos os problemas e, de fato, acaba por impactar na economia dos países, tal como um “remédio amargo”. O nível de produção e renda caíram drasticamente e o desemprego e a informalidade aumentaram em todo o país. Neste cenário, aumento nos gastos do governo federal com assistência hospitalar e assistência social se apresentaram como uma realidade necessária.
Em valores, o governo federal repassou para estados e municípios um auxílio financeiro da ordem de R$ 23,3 bilhões e em despesas adicionais dos ministérios R$ 4,9 bilhões. Apenas com o auxílio emergencial, necessário à assistência da população de baixa renda do Brasil e, portanto, em situação de vulnerabilidade, o gasto do governo federal somou até aqui R$ 121,8 bilhões.
De todo modo, em poucos meses, esta realidade completamente adversa se impôs às famílias e empresas brasileiras. Desta forma, uma análise acerca do nível de endividamento e da situação da dívida deve ser explorada. Será que as famílias e empresas brasileiras recorreram à empréstimos durante esta crise? As dívidas das famílias e empresas sinalizam um cenário de inadimplência? Como se sabe, ainda é cedo para compreender o real impacto da crise, mesmo assim, alguns movimentos já podem ser observados, então, vamos a eles.
Como se pode depreender de maneira geral, conforme Gráfico 1, as concessões de crédito a cada mês reduziram drasticamente. Partiram de um patamar de cerca de 351 bilhões de reais em fevereiro para 298 bilhões em maio (data limite de disponibilidade de dados), uma redução da ordem de 53 bilhões. E este movimento foi impulsionado, em especial, pela redução mais intensa na concessão de empréstimos para pessoas físicas.
Gráfico 1:
Apesar deste cenário de queda nas concessões entre fevereiro e maio, pode-se observar que em março (fase inicial de surto de COVID-19 no Brasil) houve um expressivo aumento no valor das concessões de crédito, alcançando o patamar mais alto do ano, aproximadamente R$ 384 bilhões. No mercado de crédito à empresas, por sua vez, verificou-se a manutenção do volume mensal de concessões de crédito como pode ser visto no Gráfico 2.
Gráfico 2:
Assim, cumpre voltar as análises para os movimentos de atrasos (períodos entre 15 e 90 dias). No Gráfico 3 são comparadas as porcentagens de atraso nas carteiras de crédito de pessoas físicas e jurídicas. Os resultados chamam atenção pela queda expressiva do percentual de carteiras de pessoas física em atraso.
Tal resultado pode enganar o leitor que não está acompanhando as notícias econômicas. Recentemente todos os grandes bancos comerciais disponibilizaram a flexibilização dos pagamentos de parcelas de dívidas. Principalmente os financiamentos imobiliários foram beneficiados com 90 dias de carência (iniciando ao final de março) para a retomada dos pagamentos das dívidas.
Vale ainda destacar que neste período em que os tomadores de crédito não pagam as parcelas o juros continua incidindo sobre a dívida e portanto ao final do benefício o tomador terá uma dívida ainda maior.
Gráfico 3:
Alguns bancos estão ampliando este período de carência para retomada dos pagamentos de dívidas. Ainda é importante destacar também que este período de carência não é concedido de forma automática e o cliente precisa sempre entrar em contato com o banco para conquistar este benefício. Caso o tomador de crédito simplesmente deixe de pagar, sem aviso ou aval da instituição, estará, sim, incorrendo em inadimplência e sujeito ao envio do CPF para a lista de nomes sujos.
Por outro lado, tornam-se nítidas as dificuldades que as empresas estão enfrentando em liquidar suas dívidas ao longo da crise que vivenciamos (a proporção de créditos em atraso salta de 1,73% em fevereiro para 2,44% em maio), mesmo recebendo benefícios de prazos de carência para retomar a pagar parcelas de financiamentos.
Portanto o que se espera para os próximos meses é um salto ainda maior da inadimplência. Isto pois, a renda das famílias está diminuindo (o desemprego aumentado) e, portanto, o comprometimento da renda com pagamento de dívida aumenta consideravelmente em proporção. Os prazos de carência devem se encerrar em breve (variam de 60 a 180 dias a depender do tipo de financiamento e do banco) e as dívidas cresceram neste período.
O Gráfico 4 ilustra o perfil do crescimento do comprometimento da renda com pagamento de dívidas da população brasileira e já nos indica uma tendência de crescimento desde 2018. Somar-se-á a estes números o impacto de meses sem redução das dívidas devido ao período de carência, os juros que continuam correndo sobre as dívidas neste período e também os novos empréstimos adquiridos no período.
Nos próximos meses o nosso grupo continuará monitorando a situação. De todo modo, as recomendações realizadas nos programas anteriores para planejamento financeiro são mais necessárias ainda. Neste sentido, recomendamos que você relembre esta entrevista:
https://conexaoitajuba.com.br/planejamento-financeiro-na-crise-de-saude-publica/
Prof. Dr. André Luiz Medeiros
Prof. Dr. Moisés Diniz Vassallo
Prof. Dr. Victor Eduardo de Mello Valerio
DENARIUS – Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Financeira
Instituto de Engenharia de Produção e Gestão (IEPG)
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI).
O painel de educação financeira é uma parceria do programa Conexão Itajubá com o Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Financeira (DENARIUS UNIFEI).
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