Há anos e anos meu sobrinho, ainda bem novo, entre adolescente e jovem, morou comigo. Eu nunca fui mãe, portanto, sem prática alguma na educação de crianças, quanto mais de jovens. Bem, imagino que as mães só muito mais tarde terão aprendido o que gostariam de ter sabido na época. É da vida. Por esse tempo, um amigo me viu tirando o carro para levar meu sobrinho para a escola que era bem perto de casa. E numa oportunidade, ele me admoestou com delicadeza, porém sem dispensar alguns laivos de sarcasmo: “seu sobrinho já é grandinho, ele pode ir sozinho para a escola”, ao que eu redargui: “mas estava chovendo!” Na verdade, quando estava muito frio eu também levava. Na verdade verdadeira mesmo, eu gostaria de levar todos os dias, por toda a vida, mesmo sabendo que não devia.
Meu amigo ficou pensativo, refletindo como quem viaja longe e voltou ao assunto. Disse ele: “como as mulheres são diferentes dos homens, você não é mãe, mas seu coração é de mãe porque você é mulher”. O que ele quis dizer é que as mulheres são protetoras, cuidadoras por excelência. Acho lindo isso, lindo, lindo as mulheres serem protetoras e cuidadoras. Tomara que nenhuma feminista esteja lendo o que escrevo. E ele prosseguiu: “se o pai estivesse presente, certamente diria, deixa o moleque ir na chuva pra aprender as dificuldades da vida!” Tá certo! Cada macaco no seu galho. Como os homens são diferentes das mulheres! E como eu gosto de ser mulher e ter coração de mãe.
Assisti a um episódio de um seriado bobinho qualquer que tratava de seres de outras galáxias que ocuparam a terra. E a mãe da outra galáxia acabava ter vários filhos, algo assim como uma ninhada como os cachorrinhos e gatinhos costumam ter. Entre os “filhotes” havia um que não se mexia, que não respirava. O pai percebeu, então ele pegou o bebê e disse à mulher que ele estava morto e se apressou a levá-lo para sepultar, ao que a mãe já chorosa, pediu para segurar um pouco o filhinho sem vida. Aconteceu que ela começou a ninar o bebê já morto, apertou-o contra o peito, afagando-o e cantando entre lágrimas uma música suave. De repente o bebê voltou à vida, a princípio num chorinho fraquinho, que depois foi se fortalecendo, e ele começou a brandir os bracinhos. Mãe é mãe, seja da terra ou de outra galáxia. Amor de mãe cura e ressuscita.
É verdade que não se ouve mais mãe dizer para os filhos: você volta já pra casa senão eu vou contar pro seu pai. E quantas vezes, quantas e quantas mães esconderam coisas dos maridos para proteger os filhos! As mães são e sempre serão diferentes dos pais, ainda que a psicologia moderna tenha incorporado novos olhares sobre essa questão. Bem, eu aqui encantada com meu coração materno! Então, mesmo não tendo tido filhos eu sou mãe em potencial. Digito isso emocionada como se estivesse descobrindo esta verdade que eu sempre soube, alegre como se me trouxessem agora um bebê para eu acalentar no meu colo. Ser superprotetora é comigo mesmo! E se alguém disser alguma coisa, eu digo: levei sim porque estava chovendo!
*Misa Ferreira é autora dos livros: Demência: o resgate da ternura, Santas Mentiras, Dois anjos e uma menina, Estranho espelho e outros contos, Asas por um dia e Na casa de minha avó. Graduada em Letras e pós graduada em Literatura. Premiada várias vezes em seus contos e crônicas.Embaixadora da Esperança (Ambassadors of Hope) com sede em Calcutá na India. A única escritora/embaixadora do Brasil a integrar o Projeto Wallowbooks. Desde 2009 Misa é articulista do Conexão Itajubá, enviando crônicas e poemas. Também contribui para o jornal “O Centenário” de Pedralva