Que espécie de emoção ou quais emoções são despertadas? Segundo Jonathan Culler, para responder essa pergunta, é preciso levantar a questão da literariedade e indagar quais os critérios para julgar se uma obra é literária ou não. O que a distingue de outras que não o são? De saída, as dificuldades são inúmeras porque as obras não obedecem a um padrão rígido, pelo contrário, pela sua imensa variedade, fogem às normas literárias, se é que se pode dizer assim. Assim, um romance que se assemelhe a uma autobiografia como “Em busca do tempo perdido” de Proust pode ser mais literário do que um poema lírico. Isso, sem contar a questão histórica, ou seja, obras literárias modernas que em outra época não teriam sido consideradas como literatura.
Por outro lado, também não basta que um grupo de críticos e intelectuais de determinada época determine que tal obra seja literária. Evidentemente, o texto deve conter uma certa organização da linguagem e representar uma realidade suposta, imitando atos de linguagem cotidianos. Isso seria, digamos assim em termos de critérios, o mínimo para que a obra contenha qualidades literárias. Entretanto, o que realmente singulariza a literariedade é uma linguagem evidenciada que faz com que o leitor receba o texto não como simples comunicação, mas que se veja enredado pela emoção transmitida.
O formalista russo Chklovski referia-se à literatura como “o caminho onde o pé sente a pedra”. É fácil, imagine só, você passa pelo mesmo caminho todos os dias e seu pé já se acostumou a todas as pedras, aí tem um dia em que você nota algo diferente, como se fosse uma pedra nova. É despertada uma emoção gostosa e estranha quando você lê algo que às vezes até já leu, porém dita de outra forma. Muitos já devem ter visto uma mensagem na internet que pode bem ilustrar a linguagem evidenciada. Um deficiente visual está sentado com um cartaz que traz as palavras: “sou cego”. Muitos passam por ele e não o ajudam, sequer o notam. Aí vem uma garota que refaz a escrita com os seguintes dizeres: “está um lindo dia e eu não posso ver”. A sorte do homem muda de forma mágica, como a própria linguagem pode ser mágica.
Em um curso sobre linguagem e escrita criativa, o professor comparou a literatura com telas de pinturas. Mostrou um quadro que representava um jarro com flores e o quadro: “Despejados,” do pintor Portinari. O primeiro, sem dúvida, é decorativo, mas o segundo provoca uma reflexão, faz pensar sobre a realidade. De forma semelhante, o literário não se afasta dos sentimentos e valores humanos. Assim, os livros chamados comerciais são mais vendáveis, são digeridos com pressa e os literários são mais reflexivos e saboreados aos bocados, como quem vai poupando uma sobremesa deliciosa.
Antonio Cândido, nosso grande crítico literário, define a literatura como aquilo que nos faz melhores, aquilo que afina nossos sentimentos e nossa sensibilidade. Diz mais, que a literatura desenvolve em nós a cota de humanidade, na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade e o semelhante. Faz com que sejamos mais capacitados para penetrar nos problemas da vida e perceber a complexidade e beleza do mundo e dos seres. Haverá melhor definição? É isso.