Há dois ou três dias venho acompanhando pelo Facebook as palavras de despedida a um professor de matemática, ditas pelos seus ex-alunos.
A foto que o Face traz mostra um senhor de (talvez) cinquenta e poucos anos, sorridente, olhar meio sapeca, com um pedaço de giz amarrado a um barbante na mão direita, e a mão esquerda saindo do bolso do jaleco, meio amarrotado, com o que parece ser um pedaço de pão…
Ler os comentários dos alunos, depois, só confirma a impressão deliciosa que se tem do professor, vendo a foto que o capturou num momento espontâneo, com certeza.
Não se ouvem lamentos na despedida; a gente quase flagra os alunos sorrindo quando desejam a ele que vá agora alegrar os anjos no céu…
Professores e Pais deveriam ser todos assim: meio moleques, meio anárquicos, um tiquinho ridículos na sua vocação de sonhar, firmes e resistentes como junco às intempéries e às frustrações, divertidos, engraçados, capazes de rir de si mesmos e da vida, donos de uma paixão inesgotável pelo ser humano, prontos a começarem tudo de novo ao menor sinal de resposta…
Utopia? Talvez…
Mas sempre foram o sonho e a utopia, os motores da vida!
Este professor me traz de volta à memória o meu pai: ele marcou muita, muita gente com o seu jeito de ser.
Além de ser a melhor pessoa prá se ter ao lado quando tudo ia bem, ainda era o primeiro a chegar, nunca de mãos vazias, quando alguém precisava de conforto. Sem alarde, como se ajudar fosse a sua missão.
Quando ele morreu não foi enterrado; ele sempre disse que preferia a cremação.
Cerimônia linda, delicada, envolta em música suave (eu escolhi as Quatro Estações de Vivaldi), um silêncio solene mas leve e doce, as pessoas que assim o desejam têm o tempo necessário para dizerem dos seus sentimentos.
Terminada a cerimônia (tinha tanta gente que o Administrador do Crematório autorizou que se fizessem duas sessões), desconhecidos em grande número se aproximam de mim e da mamãe.
Um após o outro, nos contam histórias incríveis sobre o papai: alguns tentaram nos devolver dinheiro que ele lhes emprestara e nunca mais cobrara, outros contavam que ele lhes pagara cursos profissionalizantes, outros ainda diziam que ele “apenas” os ouvia, quando estavam desesperados…
Nunca soubéramos de nada disso, mamãe e eu!
Até hoje eu penso que me tornei professora e médica paliativista para me sentir mais perto dele…
Ensinar e Cuidar são irmãos gêmeos do Amor, estou certa disso!
Graça Mota Figueiredo
Professora Adjunta de Tanatologia e Cuidados Paliativos
Faculdade de Medicina de Itajubá – MG