Num dia de abril do ano de 2004, subiamos pela Serra do Despropósito, que fica a uns 1100m de altitude no município de Cristina , por volta das oito da noite quando uma tempestede nos alcançou. Era uma tempestade diferente, como eu nunca tinha visto antes, principalmente no mês de abril. Não tinha lua nesta noite e estava escuro. Cavalgavamos as escuras, confiando inteiramente nos cavalos, quando começou a ventar. Também não era um vento comum, acho que a velocidade era de uns setenta Km por hora. Relâmpagos pipocavam por toda parte e o que é pior, estavamos no meio de uma mata, que margeava a estrada pelos dois lados. Senti naquele momento que corriamos perigo. A ventania podia jogar galhos contra nós ou o que podia ser pior, um raio podia nos atingir. Me senti indefeso, não havia nada a fazer, a não ser confiar inteiramente em nossos cavalos. Foi o que fizemos.
Em toda minha vida equestre nunca tinha passado por uma experiência daquelas. Cavalgadas noturnas é cumum pra mim, já participei de várias, já perdi a conta de quantas vezes varei noite cavalgando em baixo de chuva, forte ou fraca, com lua ou sem lua. Senti medo. Principalmente no início da tempestade, que nos pegou de surpresa, fiquei assustado mas logo a seguir passei a sentir que meu cavalo estava tanquilo, como se nada estivesse acontecendo. Acredito que ele também nunca havia passado por uma tempestade daquelas, pois foi criado por mim e não lembro de ter tido uma tempestade assim nos últimos seis anos, que é sua idade, nem nos últimos quarenta e dois anos que é a minha idade.
Foi incrível, eu cavaleiro experiente, não pude perceber no início a intenção de meu cavalo porque fiquei preocupado com a tempestade e esqueci do principal.
O nome do cavalo que eu estava montando é Zidane. É um cavalo mangalarga marchador registrado de cinco anos e meio que foi criado no haras Lua Negra de Renato Neves Tonini e domado por mim. É o cavalo que monto quando faço enduro e fomos no ano de 2003, vice campeões carioca de enduro na classe aberta com quatro segundo lugares e três primeiros. Apesar de ser um cavalo jovem, Zidane é muito calmo e confia inteiramente em mim. Naquela noite de tempestade ele me lembrou que devia, além de confiar nele também devia ouvir o que ele estava dizendo. Não importando o perigo que estavamos correndo, ele me dizia: não se preocupe, esta tudo bem, vamos sair desta, confie em mim.
Depois daquela noite, apesar de sempre ter comigo que para formar um relacionamento forte com os cavalos devemos confiar inteiramente neles. Passei a acreditar que apesar da total confiança devemos ouvir o que eles estão dizendo. Zidane passou toda sua vida em minha companhia. Sempre entendo suas reações e sei exatamente o que quer dizer suas atitudes, mais as vezes deixo de ouvir o que ele esta dizendo.Aquela noite de tempestade me deu uma lição, a de que sempre devemos ouvir o que os cavalos estão dizendo. Se não sabemos entender sua linguagem, devemos aprender porque um verdadeiro homem de cavalo tem por obrigação saber o que seu cavalo esta “falando”, pois assim saberemos ir até o limite de sua capacidade e ele saberá confiar em nós e fará tudo o que tiver a seu alcance para para nos satisfazer, pois nossa satisfação é a satisfação dele também.