Cristo disse: “É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus” (Mt 19,24). Comentando esta afirmativa do Senhor, Clemente de Alexandria – século III – falou que as riquezas são dadas ao homem pela munificência de Deus bom; assim, não são nem boas nem más, pois é o homem que lhes dá a sua qualificação ética. E não são elas que precisam ser destruídas, mas os vícios do coração – que provocam a avareza dos que as possuem e a cobiça dos que não as têm.
São Basílio, bispo de Cesareia no século IV, se insurgiu contra a ganância em numerosos textos: “Possuir mais do que o necessário é prejudicar os pobres, é roubar”. “Quem despoja um homem das suas vestes, terá nome de ladrão, e quem não veste a nudez do mendigo quando o pode fazer, merecerá outro nome?”. “Ao faminto pertence o pão que tu guardas; ao homem nu, o manto que fica nos teus baús; ao descalço, o sapato que apodrece na tua casa; ao miserável, o dinheiro que tu guardas enfurnado”.
E no século V, Santo Agostinho comentou: “Vemos, às vezes, que um rico é pobre e o pobre oferece-lhe seus préstimos. Eis que alguém à beira de um rio e, quanto tem de posses, tem de delicado, não conseguirá atravessar; se tirar a roupa para nadar, teme resfriar-se, adoecer, morrer… Chega um pobre, mais robusto e preparado, ajuda o rico a atravessar e faz esmola a ele”.
Portanto, não são pobres somente os que não têm dinheiro. Observe, você também, em que é pobre, porque, com certeza, é rico sob outro aspecto e poderá prestar ajuda a muita gente. Talvez fosse melhor ajudar alguém com seus braços do que se ajudasse com dinheiro. Deus é quem nos dá tudo e nós apenas repassamos – todos recebemos Dele, o único rico do universo.
Certa ocasião, João Paulo II fez um breve resumo sobre o Salmo 8: Grandeza de Deus e dignidade do homem. Ele disse: “Queridos irmãos e irmãs! O domínio do homem, que o Salmo 8 nos narra extasiado, não pode ser exercido humilhando os nossos semelhantes e a criação. O apelo e a esperança do salmista encontrará plena realização em Jesus Cristo, que ‘não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por todos’ (Mc 10,45). Ele é o homem perfeito; domina o universo com a força da paz e do amor, que preparam os novos céus e a nova terra”.
Com estas palavras do Papa em relação ao ‘domínio desumano do homem no mundo’, o que mais dizer? Se o próprio Deus nasceu pobre e se humilhou, haverá de entrar no Céu aquele que acumula tesouros e humilha o semelhante?
Conta-se que um velho analfabeto rezava com tanto fervor a cada noite que, certa vez, o rico chefe da grande caravana que viajava chamou-o e perguntou:
– Por que reza com tanta fé? Como você sabe que Deus existe, quando nem ao menos sabe ler?
O fiel cristão respondeu:
– Quando o senhor recebe uma carta de pessoa ausente, como reconhece quem a escreveu?
– Pela assinatura!
– Quando recebe uma joia, como é que se informa quanto ao autor dela?
– Pela marca do ourives!
– E quando ouve passos de animais ao redor da tenda, como tem certeza, depois, se foi um carneiro, um cavalo ou um boi?
– Pelos rastros, é claro!
Então, mostrando-lhe o céu, onde a lua brilhava cercada por multidões de estrelas, o fervoroso velho falou respeitoso:
– Senhor, e aqueles sinais lá em cima? Não podem ser dos homens, concorda?
Naquele momento, o orgulhoso caravaneiro, já com os olhos lacrimosos, esqueceu-se da sua ‘riqueza’, ajoelhou-se na areia e também começou a rezar.
Pois é, nesse nosso mundo globalizado e cheio de correrias, tudo gera explicações e preocupações. Quem trabalha com computadores, se desespera quando a internet não funciona; quem só pensa em investimentos, quebra a cabeça para não vir a perder um centavo sequer… E a vida espiritual, como fica? Quantos se preocupam com as ricas novenas que acontecem na cidade ou com os famintos que sofrem calados?
A vida de Frei Pio – 758o santo da Igreja quando canonizado – era rica em miséria e sacrifícios. Em 1912, ele assim escreveu: “Deus escolhe as almas e, entre elas, apesar da minha indignidade, escolheu também a minha para ter uma ajuda na grande obra da salvação humana. Há algum tempo sinto a necessidade de entregar-me ao Senhor como sacrifício pelos pobres pecadores. Suplico-lhe que envie sobre mim os castigos preparados aos pecadores, multiplicando-os, contanto que os mais pecadores se convertam”. Viveu, portanto, como um rico instrumento nas mãos de Deus.
Após todas essas reflexões, podemos concluir que a riqueza é, pois, indiferente: nem boa, nem má. O coração do homem é que a torna boa ou má. Quem está apegado às riquezas materiais, dificilmente entrará no Reino de Deus, mas quem não tem o coração preso às coisas do mundo, esse poderá entrar no Céu.
Santa Madre Tereza de Calcutá dizia: “A vida é uma oportunidade, aproveite-a. A vida é beleza, admire-a. A vida é um sonho, torne-o realidade. A vida é um desafio, enfrente-o. A vida é um dever, cumpra-o. A vida é preciosa, cuide dela. A vida é uma riqueza, conserve-a. A vida é um mistério, descubra-o. A vida é tristeza, supere-a. A vida é um hino, cante-o. A vida é uma luta, aceite-a. A vida é a vida, defenda-a”.
Eu diria que viver uma experiência religiosa é se fazer pobre para ser digno de viver como filho rico do Criador e alcançar o seu Reino após a morte. Você já experimentou viver assim?