Depois das eleições, confirmou-se a já prevista estonteante vitória de Tiririca (Francisco Everardo Oliveira Silva). Palhaço de profissão, Tiririca embarcou como candidato a deputado federal com o slogan “vote Tiririca, pior que tá não fica!”. Durante a propaganda eleitoral, Tiririca declarava jocosamente não saber o que faz um deputado federal e pedia os votos do eleitor, comprometendo-se, depois de eleito, a explicar do que se trata o cargo. Mas, de acordo com as notícias, Tiririca pode não chegar à Câmara dos Deputados porque foi denunciado à Justiça após reportagem da revista Época. O humorista foi apontado como sendo analfabeto, descumprindo uma exigência da constituição para o cargo eletivo. O caso se agrava pelo fato de existir a possibilidade de o candidato ter apresentado uma declaração de próprio punho, supostamente falsa, para comprovar a sua alfabetização.
Enquanto nada está decidido, pode-se fazer uma reflexão. Fala-se em voto de protesto ou “gesto de protesto”, exatamente o que fizeram mais de um milhão de pessoas ao votarem em Tiririca. Isso não é privilégio dos tempos atuais. Desiludidos com a política em todos os tempos, os eleitores já votaram em macacos, rinocerontes, Xuxas, Pelés, Ronaldos e outros mais. Só que esses supostos candidatos não eram elegíveis, mas o Tiririca, fabricado e conduzido por outros interesses, obteve sucesso nas urnas, puxando votos para outros deputados que normalmente não seriam eleitos.
É verdade que o senso de humor do brasileiro é notável e deve prevalecer em todas as situações da vida, mas o deboche não vai nos salvar da tragédia política. Há um tempo para tudo, tempo para rir e tempo para chorar. Este último parece o mais apropriado para o momento. A câmara dos deputados e o Senado não são picadeiros de circos, ainda que muitos que por lá passaram pareciam não saber. Esse “voto de protesto” significou fazer o jogo dos que o planejaram. Estamos, pelo que se vê por aí, a anos luz da consciência e maturidade política.
Para ser parlamentar, não deveria bastar apenas uma prova de que se é alfabetizado. O médico estuda medicina, o engenheiro, engenharia, o professor, pedagogia e o parlamentar? Talvez se os candidatos pudessem se sentar por quatro ou cinco anos aprendendo sobre a arte de fazer política e conhecendo exemplos de grandes estadistas e filósofos, conseguissem compreender a seriedade de seu mandato. Estudar só faz bem e ninguém deveria se orgulhar de não tê-lo feito, havendo tido a oportunidade. Quem sabe assim nosso cenário político pudesse mudar? Quem sabe assim não seria tão difícil escolher um bom candidato, tarefa que exige verdadeiros malabarismos por parte do eleitor (falando em circo) o que faz com que ele opte pelo voto de protesto.
Nada pessoal contra o Tiririca. Pode ser que ele, analfabeto ou não, desempenhasse melhor o serviço parlamentar do que os doutores carregados de títulos e dinheiro nas meias e cuecas. Por outro lado, se o analfabeto pode votar, por que não pode ser candidato e eleito? Reflitamos: se o Tiririca não tivesse obtido o mínino de votos para ser eleito, teria sido processado? Oh! Santa hipocrisia! Estranha e esdrúxula legislação a nossa!
Mas ainda assim, a educação será sempre a esperança para tantos percalços. Que os que consigam ser eleitos, lutem para que todos os brasileiros possam estudar. Enfim, enquanto isso, cada um no seu departamento ou, como diria minha avó, cada macaco no seu galho. Pior para o Tiririca, pior para os brasileiros.