O que me põe muitas vezes a pensar é de onde vem esse desejo profundo que alguns médicos (não todos, infelizmente) sentiram um dia e que muitos permanecem sentindo, dia após dia, apesar da crua realidade às vezes frustrar os melhores sonhos…
Desejo de fazer o bem, seja a quem for; desejo de se dedicar a minorar o sofrimento dos humildes; desejo verdadeiro de compreender a necessidade dos fracos; desejo de se dedicar, de se doar, de servir…
É claro que ser médico dessa forma não é ser um sacerdote mantido por uma Instituição que assegura a vida material; é claro que é preciso ser remunerado e viver com dignidade, e ter filhos para quem se pode preparar o futuro.
Mas é inegável que existem dois tipos de médicos: aqueles que chegam às escolas de medicina e por lá ficam até serem médicos, e aqueles que, se não chegarem a ser médicos não serão felizes…
E esses são facilmente identificáveis: seus olhos brilham durante quase todo o tempo em que se sentam em frente aos doentes, seus mais sábios professores. Eles choram (ou, ao menos enxugam furtivamente os olhos) quando uma criança à morte lhes é trazida, ou quando um velho se despede da vida, ou quando um pai de família ou uma mãe deixam sozinhos os filhos que ainda não estão prontos para navegarem com segurança pelo futuro.
Eles sofrem, duvidam das suas escolhas, revoltam-se contra os deuses nos quais acreditavam; eles vivem entre conflitos, ficam doentes no corpo e na alma quando não têm quem os escute…
Esses são os que ouviram o chamado!
Esses descendem de Kíron, o Curador Ferido, do Centauro mítico que se dedicou a cuidar das dores dos homens justamente porque sofria de uma ferida que não podia ser curada, e sabia da angústia e do desespero de quem tem uma doença que não dá trégua…
Esses são aqueles que merecem ser chamados médicos; esses são aqueles que servem a outros sem se julgarem inferiores. Esses são os que descendem do mais puro desejo que o homem gerou: o de serem úteis, o de serem genuinamente caridosos, o de serem Humanos como todos deveríamos ser…