A cultura americana, que tem sido a grande carreadora das transformações sociais modernas, mostra com clareza a evolução desta tendência. A “primeira onda” foi o movimento do potencial humano nos anos 1960, liderado por Abraham Maslow. Ele considerava a espiritualidade pessoal ou a realização de si mesmo, como um dos principais componentes do crescimento psicológico de uma pessoa.
Em Religions, Values and Peak Experiences, ele diz: “Quero demonstrar que os valores espirituais têm um valor naturalista, que não pertencem com exclusividade a igrejas organizadas, que não precisam de conceitos sobrenaturais para validá-los, que bem podem estar contidos na jurisdição de uma ciência adequadamente ampliada (o destaque é meu) e que, por essa razão, são de responsabilidade geral de toda a humanidade”.
A “segunda onda” é o movimento New Age nos anos oitenta do século passado, um pout pourri de tradições e práticas espirituais oriundas de diversas culturas, especialmente as culturas orientais com o seu conceito individual e intimista de Espiritualidade. Não demorou para que as ciências da saúde se vissem invadidas pelo anúncio da eficácia das práticas espirituais na cura de doenças. Estas práticas se incorporaram às ações do cotidiano das pessoas, e o movimento hoje perdeu o seu caráter elitista e se popularizou. Importante é notar que há conseqüências nefastas: o glamour do uso de drogas para a expansão da consciência e para o encontro com a transcendência se evaporou, deixando exposta a “cara feia do vício”, problema social grave nos dias de hoje.
No início dos anos 90, anunciou-se a “terceira onda”, o movimento em direção à alma. Em 1991 Thomas More publicou o seu best-seller, “Care of the soul”. Em pouco tempo a palavra alma se tornou comum em diversos contextos não ligados à religião.
Assim o casamento íntimo entre Religião e Espiritualidade que durara, no mundo ocidental, os dois mil anos do cristianismo, se desfaz e surge agora uma Espiritualidade laica, individual, polimórfica e generalista.
Um grande incremento a este divórcio veio através dos escritos de Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço contemporâneo de Sigmund Freud e que teve o imenso mérito de mesclar à ciência da saúde conceitos de ramos do conhecimento tão díspares quanto Mitologia, Antropologia, Arqueologia, Astrologia, Alquimia… Ele confere à Espiritualidade o status de necessidade estrutural, arquetípica (*) do homem e à Religião, o papel de veículo desta necessidade, com a tarefa de adaptá-la a cada momento cultural particular.
(*) arquétipos são, segundo Jung, padrões imateriais e eternos em cada espécie, que conferem os comportamentos próprios a cada uma delas.
Até a próxima coluna.