A falta de domínio do Maranhão sobre o Complexo Penitenciário de Pedrinhas fez com que os senadores da Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado tivessem dificuldades em visitar o presídio hoje (13). O diagnóstico foi feito pelo senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), que faz parte da comissão e esteve em São Luís (MA) com os colegas.
Segundo Randolfe, os senadores não puderam entrar em uma ala do presídio por falta de segurança. “Nós entramos no presídio, mas teve uma ala em que tivemos recomendações de que não tínhamos condições de entrar. Nós insistimos para entrar em uma ala que era dominada pela facção Bonde dos 40 e entramos, mas teve outras alas que não houve condição de entrar”, disse o senador.
O senador disse que o que a comissão de senadores observou na visita à capital maranhense que “é necessário restaurar o domínio do Estado” sobre os presídios. O grupo de seis senadores teve reuniões na Ordem dos Advogados do Brasil com organizações da sociedade civil, no Tribunal de Justiça do estado e com a governadora Roseana Sarney. Ao voltar para Brasília, eles pretendem se encontrar ainda com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Para o senador, existem três problemas crônicos no Maranhão. Um deles é a presença das facções criminais que dominam o presídio de Pedrinhas e que comandaram os ataques a São Luís no começo do mês. Segundo Randolfe Rodrigues, além do Bonde dos 40, existe outra facção chamada Primeiro Comando do Maranhão (PCM), que é um braço do Primeiro Comando da Capital (PCC) – facção que comandou ataques semelhantes em São Paulo. A falta de controle sobre essas lideranças poderia, na opinião do senador, levar a casos semelhantes em outros estados.
“O que percebemos aqui é que foi uma atuação do crime organizado extrapolando os muros do presídio pela primeira vez em um estado do Norte e Nordeste. O que aconteceu aqui [no Maranhão] pode acontecer nos estados vizinhos. Nossa visita tem caráter preventivo. A pergunta que nós temos que fazer ao ministro da Justiça é: o que está sendo feito para evitar que isso se alastre para os outros estados? O PCC tem influência em 24 unidades da federação”, apontou o senador.
A falta de agentes penitenciários concursados e a utilização de funcionários terceirizados são os problemas encontrados pelos senadores. De acordo com Randolfe, eles apuraram que existem seis terceirizados para cada agente concursado, ganhando menos e recebendo menos treinamento. “Isso fragiliza o sistema”, diz o senador.
Por fim, o grupo de senadores também observou que existem muitos presos provisórios convivendo com presos permanentes, o que gera superlotação e contaminação do sistema penitenciário. Para o senador Edison Lobão Filho (PMDB-MA), que não é da Comissão de Direitos Humanos, mas foi convidado a acompanhar o grupo por ser do estado, o Judiciário tem sua responsabilidade sobre a questão.
“O Judiciário tem sua responsabilidade no sentido de dar celeridade aos processos. No presídio nós encontramos centenas de presos temporários que estão lá a mais de 300 dias. Teve um que estava lá a 3 anos. São presos que podem ser até inocentados depois”, disse.
Para Lobão Filho, também é preciso dar mais apoio ao efetivo policial e cobrar do Legislativo “leis mais duras e mais eficazes”. Neste ponto, o senador acredita que a aprovação do novo Código de Processo Penal, que está em tramitação no Congresso, pode ajudar. “É preciso acabar com essa quantidade de recursos e tornar a conclusão dos processos mais rápida. O Estado precisa parar de passar a mão na cabeça da bandidagem”, disse.
No mesmo sentido, o senador reclamou da falta de atenção dada à família das vítimas em relação ao que vem sendo feito pelos presos. “Eu acho que há um equívoco nas visitas de direitos humanos. A prioridade deveria ser as vítimas. Em segundo lugar, nós temos que nos preocupar com os policiais e suas famílias. Não vejo preocupação com esses agentes da segurança que estão sob pressão todos os dias. O preso deve ser o último na fila de prioridades. Deve-se ter sim uma preocupação com eles, mas não da forma como está sendo feito”, afirmou Lobão Filho.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Maranhão, Mário Macieira, disse que recebeu denúncia de tortura a detentos do Complexo Penitenciário de Pedrinhas. Ele teme que a situação carcerária no Brasil caia novamente no esquecimento, como aconteceu em ocasiões anteriores. Macieira participou ontem (13) de reunião com membros da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal.
A reunião contou com a presença de representantes da sociedade civil, do Ministério Público, da Pastoral Carcerária e de magistrados. A diligência dos senadores em São Luís tem objetivo de verificar a situação do Complexo Penitenciário de Pedrinhas. “Foi uma reunião positiva e os senadores tiveram oportunidade de ouvir uma parte representativa da sociedade, que tem visão muito clara do que ocorre nos presídios”, disse Macieira.
Macieira apontou três problemas para a crise prisional no estado. Um deles é a terceirização da segurança nos presídios. “A falta de agentes penitenciários concursados é uma porta aberta para a corrupção, a violência e o tráfico nas unidades prisionais”. Ele conta que, após a entrada da Polícia Militar em Pedrinhas, recebeu inúmeras denúncias de maus-tratos, tortura e presos alvejados por bala de borracha.
Para o representante dos advogados maranhenses, o modelo de concentração dos detentos é um problema porque facilita o aparecimento de facções, superlotação e rebeliões. “Isso gera uma cultura de violência entre os detentos. Precisamos desconcentrar a execução das penas em São Luís e construir presídios no interior do estado.”
Para Macieira, a deficiência estrutural do Poder Judiciário é um fator preocupante. “Em muitos lugares ou não há juiz, ou promotor, ou defensor público, ou até advogado. O Maranhão tem um dos piores índices de acesso à Justiça, e isso compromete todo o sistema”.
Segundo Macieira, a OAB documenta desde 2007 problemas nos presídios do Maranhão. “É uma situação caótica. As medidas anunciadas são tópicas, para problemas pontuais, e revelam um Estado incapaz de resolver o caso”, disse. “Temos uma série de questões a serem enfrentadas em um trabalho desenvolvido cotidianamente. Só quando acontece um caso extremo os olhos se voltam e depois a situação cai no esquecimento novamente”.
A situação dos presídios maranhenses ganhou destaque quando vídeos de quatro presos decapitados foram divulgados. Vários ônibus foram incendiados em São Luís, por determinação de detentos de Pedrinhas. Cinco pessoas ficaram feridas, quatro delas ainda seguem internadas e uma morreu em decorrência das queimaduras. A situação gerou uma crise que mobilizou governos estadual e federal, entidades de segurança e de direitos humanos.
Durante todo o dia de hoje, os senadores farão reuniões em vários órgãos para saber como cada um atua na melhoria do sistema penitenciário maranhense. Eles visitaram o Complexo de Pedrinhas e se reuniram com autoridades do Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública. No fim da tarde haverá audiência com a governadora Roseana Sarney e, à noite, um encontro com as famílias das vítimas do incêndio ao ônibus na Vila Sarney Filho, em São Luís.
A comitiva é formada pela presidenta da comissão, senadora Ana Rita (PT-ES), o vice-presidente, senador João Capiberibe (PSB-AP), o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e o senador Humberto Costa (PT-PE). A Comissão de Direitos Humanos deverá encaminhar pedidos de informação a diversos órgãos de governo e vai tratar do assunto no dia 5 de fevereiro, em sua primeira reunião do ano.
Fonte: Agência Brasil