Trata-se da rotineira linha do empréstimo consignado, contratado com a atividade bancária, mas operacionalizado pela autarquia previdenciária.
Assim, um simples aposentado ou pensionista que preenchem determinados requisitos fazem a opção pelo empréstimo consignado, calculando determinado valor e inserindo no benefício, junto ao INSS, a rubrica específica da consignação mensal, aliás contratada e permitida pelo beneficiário.
Pois bem, por esse modesto artigo, ousamos a também ressaltar que essa rotineira contratação e seus desdobramentos tem sido alvo de constantes discussões judiciais.
Incontroversa a permissão legal a respeito, quiçá garantida por legislação federal e com aval do Banco Central, contudo, não rara às vezes, essa aparente facilidade econômica tem sido alvo de tormentosos prejuízos aos contratantes.
De início, que a contratação visivelmente não tem se mostrado de forma clara, transparente, com todas as informações importantes e necessárias a respeito.
Por outro lado, pouca fiscalização há, ou quase nenhuma nessa legal atividade bancária que assedia desmedidamente aposentados e pensionistas com o ímpeto claro de exploração e ampliação da sua atividade-fim.
Ainda, que existe pouca formalização, isto é quase sempre o contratante possui em mãos tão somente um termo de adesão, equivalente a uma simples ficha de atendimento, longe de ser o verdadeiro contrato firmado pelo beneficiário do INSS.
Situações outras como mal atendimento, greve da atividade bancária, problemas operacionais, informações divergentes com as agências, enfim tem sobremaneira prejudicado os sofríveis aposentados e pensionistas do INSS.
Contudo, em meio a esse conhecido e constante caos o Judiciário tem dado efetiva e importante resposta a seus abrigados, por meio da emergente tese do “Dano Moral Previdenciário”.
Sabidamente, há muito a reparação civil por danos morais ou mesmo materiais tem sido acolhida pela tutela jurisdicional, sob diversos aspectos, contudo, vivenciamos um momento de aplicação direta desse direito constitucionalmente sedimentado em 1988 para o campo previdenciário.
Para as relações do empréstimo consignado a situação não difere, vale dizer, existem valorosos precedentes a respeito, de forma a punir, reparar e educar o ofensor por lesão a determinados interesses previdenciários.
No nosso “Dano Moral Previdenciário”, Editora LTR, 2016, já na terceira edição, discorremos de forma aprofundada a respeito.
Ainda que ocorra a contratação particular do aposentado ou pensionista com o agente bancário concessor do empréstimo, evidente que o elo com o INSS, o gestor das prestações previdenciárias, é direto e solidário.
Afinal, a prestação é gerida e paga mensalmente pelo INSS e não pela atividade bancária.
Destacamos alguns precedentes dessa importante intervenção judicial:
“REPARAÇÃO DE DANOS. EMPRESTIMO CONSIGNADO COM DESCONTO EM BENEFÍCIO DE APOSENTADA. DEFEITO DO SERVIÇO. DESCONTO EM FACE DE CONTRATO QUITADO. INDENIZAÇÃO FIXADA EM VALOR ADEQUADO.I. Comprovado nos autos a quitação do contrato em 13.05.2009, resultado obviamente indevida a permanência dos descontos mensais em benefício previdenciário. (…) IV. No caso particular faço ressalva que não há qualquer elemento que permita se cogitar a majoração do “quantum” indenizatório, como postula a autora, já fixado emR$ 1.200,00, pois o conjunto probatório revela ter ocorrido apenas 01 desconto indevido, o qual foi posteriormente restituído pelo réu (…) SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO”.(TJRS, Proc.: 71003066677/RS, Rel.: Des. Carlos Eduardo Richinitti, J. em 27/09/2011, D.J. 29/09/2011)
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS E MATERIAIS. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INSS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO. DESCONTO INDEVIDO EM CONTA BANCÁRIA. RECURSO DESPROVIDO.1. O regime legal aplicável ao desconto, em proventos previdenciários, de valores de empréstimo consignado contratado por segurado da Previdência Social, encontra-se previsto no artigo 6º da Lei 10.820/2003. 2. Segundo tal legislação, cabe ao segurado contratar o empréstimo na instituição financeira de sua escolha e autorizar a retenção, pelo INSS, do valor devido na parcela mensal do respectivo benefício previdenciário (caput). O INSS deve fixar regras de funcionamento do sistema, incluindo todas as verificações necessárias (§ 1º e incisos), sendo responsável, especificamente, conforme o § 2º do artigo 6º da Lei 10.820/2003, (…) 3 (…) 4. (…) Estando legalmente previstas as suas atribuições, o fato de o INSS não se desincumbir, adequadamente, de suas responsabilidades, ao simplesmente reter e repassar valores informados pelo DATAPREV, sem a cautela no sentido de conferir, com rigor, os dados do segurado e da operação, para evitar situações de fraude (como decorre, por exemplo, da contratação por segurado residente em São Paulo de operação de empréstimo na Bahia ou no Amazonas) não o exime de responder pelos danos decorrentes da lesão praticada contra o segurado. 5 (….) 6. (…) 7. O dano material sofrido consistiu no valor do benefício, retido e repassado indevidamente (…) o saldo a ser ressarcido de R$ 414,04, a que foram condenados Banco Cruzeiro do Sul e INSS, solidariamente, (…) 8. O dano moral restou igualmente configurado, diante da prova, de que a retenção e o desconto de parcela do benefício previdenciário não geraram mero desconforto ou aborrecimento, mas concreta lesão moral, com perturbação grave de ordem emocional, tratando-se, ademais, de segurado idoso, que se viu envolvido em situação preocupante, geradora de privação patrimonial imediata, criada pela conduta dos réus. 9. (…) 11. Portanto, nos limites da devolução, deve ser mantida a condenação do INSS aopagamento solidáriodos valores de R$ 414,04, relativos aos danos materiais suportados, e R$ 3.000,00, referentes aos danos morais sofridos(…)“.(TRF da 3ª Região, Proc. 0003191-02.2007.4.03.6107/SP, 3ª T., Rel.: Des. Fed. CARLOS MUTA, j. em 25/06/2015, e-DJF3 02/07/2015)
Logo, digno de aplausos e efusivos elogios o Poder Judiciário acerca dessa questão fática, como registrado, rotineira, afinal toda a atividade econômica tem o seu bônus, mas também deve guardar seu ônus.
E mais, quando o cerne do contrato engloba direito previdenciário, a tutela protetiva deve ser máxima, concreta e acima de tudo exemplar, pois como é cediço, previdência é um autêntico direito social, constitucional, fundamental, portanto imprescindível.
Sérgio Henrique Salvador
Especialista em Direito Previdenciário. Professor Universitário. Escritor. Colunista. Advogado em Minas Gerais. Membro da Rede Internacional de Excelência Jurídica.